O acordo fracassou na segunda bola



Em todo 1º de maio, Dia do Trabalho, feriado nacional, sempre havia no Recife e em muitas cidades do interior de Pernambuco um jogo de portões abertos promovido pelas chamadas classes produtoras, dedicado aos trabalhadores. No Recife era praxe. Estádio lotado sem os atos beligerantes que alguns foras da lei costumam praticar nos dias atuais, contribuindo para que muita gente boa deixe de acompanhar o futebol ao vivo, preferindo a televisão, quando tem. Muito cara que não tinha dinheiro para pagar ingresso, aproveitava esse dia para garantir seu lugar na arquibancada, na base do 0800.

Num desses jogos, o Santa Cruz deu uma goleada de 5 a 1 no Bahia e mostrou à massa, um jogador saído do juvenil, que tinha um futuro promissor. Era o então ponta-esquerda Givanildo, que recebeu uma chance do técnico Gradim e soube segurá-la. Além de uma grande exibição marcou um dos gols.

No interior do Estado, principalmente na zona canavieira sempre havia um jogão. Certa vez, o famoso Leão XIII, ligado à poderosa Usina Catende, presenteou seus operários com uma exibição do Sport. Nesses times das usinas, os jogadores eram fichados na indústria como funcionários nas mais diferentes funções, mas o que faziam mesmo era jogar.
Garrinchinha era um ponta-direita maranhense muito veloz e driblador, que defendia o Leão da Ilha. Foi juvenil no Botafogo na época de Garrincha e puxava um pouco por uma perna. Daí o apelido.

Garrinchinha no time do Sport, nos Aflitos, ainda no tempo do 'balança, mas não cai.". Em pé, Alemão, Baixa, Leduar, Walter, Tomires e Nenzinho; agachados, Garrinchinha, Djalma, Abílio, Laxixa e Marcos Chinês


Naquele feriado, antes de ser iniciado o tal amistoso em Catende, o lateral esquerdo do Leão XIII, que teria a função de marcar Garrinchinha, fez-lhe uma proposta um pouco estranha, mais ou menos assim:
– Garrinchinha, ganhar ou perder aqui, pra vocês não quer dizer nada. Se o Sport for derrotado haverá a desculpa de que por ser um amistoso, vocês jogaram desinteressados. Mas nós precisamos manter o emprego. Então, a gente faz um acordo. Uma bola é minha e outra é tua...
Garrinchinha franziu a testa, porém, como se tratava de ajudar aquele coitado e o jogo não valia nada mesmo, concordou.

Na primeira jogada em que a bola chegou à lateral, o jogador do Leão XIII antecipou-se, Garrinchinha ficou na manha e o cara foi embora. Na segunda oportunidade, quando seria a vez de Garrinchinha, o lateral não quis conversa. Antecipou-se ao ponta do Sport e deixou o número 7 leonino na saudade. Quando ele voltou para a marcação após desvencilhar-se da bola, Garrinchinha chiou:
– Amigo, a bola era minha, não foi combinado?   
O jogador do Leão XIII, na esperteza, respondeu:
– Era, mas você demorou...
O acordo acabou-se ali.

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