Fragmentos da saga alvirrubra (1)


Das regatas e passeios pelo Capibaribe surgiu o Náutico


Neste domingo, 7 de abril de 2019, o Clube Náutico Capibaribe comemora a passagem do 118º aniversário de sua fundação, o que ocorreu em 7 de abril de 1901. O Alvirrubro surgiu como decorrência das regatas de remo, que na época atraíam a juventude recifense. Nas então águas cristalinas do rio Capibaribe, que corta o Recife, espalhando seus braços por vários lados da cidade, sempre havia rapazes exercitando-se.
            Remava-se, ora em competição, ora como simples diversão. Comumente, grupos de rapazes alugavam barcos e saíam rio acima, dando suas remadas, indo às vezes, até o bairro de Apipucos, uma zona residencial ou de veraneio para recifenses abastados.

  
                                                                                 
                                                                                                                                        
            O relato mais autêntico sobre a fase que antecedeu o Náutico foi feito por um daqueles rapazes, Hermann Ledebour:
            Em 1897, um grupo de rapazes amantes do remo, tendo à frente João Victor da Cruz Alfarra, costumava alugar embarcações na antiga Lingueta , de onde partiam em direção à Casa dos Banhos, Ilha do Pina e algumas vezes, rio acima até Poço da Panela, Apipucos, etc.
            Uma regata havia sido marcada para o dia 21 de novembro daquele ano. Fazia parte dos festejos para recepcionar as tropas legalistas que acabavam de voltar vitoriosas ao Recife, após o término do movimento de Canudos, com a derrota do Conselheiro e seus seguidores. A prova náutica foi um sucesso, o que serviu de estímulo para que fosse criada uma associação que recebeu o nome de Clube dos Pimpões, que contava com a participação dos empregados das ruas Direita e Rangel. Algumas competições foram, a partir de então, disputadas com muito entusiasmo pelos dois grupos, os da antiga Lingueta e os da nova agremiação, o pessoal do novo Clube dos Pimpões.
Eram dados os primeiros passos para a criação de uma agremiação destinada a escrever páginas gloriosas em sua existência. O Clube dos Pimpões logo foi transformado em Clube Náutico Capibaribe ao ser reorganizado.
Antes da oficialização, com nome e data, do Náutico, houve duas tentativas de agrupamento de uma turma de remadores numa associação. Assim, inicialmente apareceu o Clube dos Pimpões. Depois veio o Recreio Fluvial. Em dado momento, no intervalo de tempo entre o nascimento de um e outro, chegou-se a criar um embrião do Clube Náutico Capibaribe, sob esta mesma denominação. Como o Clube dos Pimpões e o Recreio Fluvial, teve vida efêmera, para depois retornar de maneira definitiva e organizada.
O que existira antes não passava de um movimento protagonizado por aficionados do remo, mas sem a documentação que viesse a fazer com que o clube existisse oficialmente. Isso veio a acontecer em 7 de abril de 1901, com a lavratura da ata de fundação. Agora, sim, o Clube Náutico Capibaribe passava a ser uma realidade. Existia, de fato e de direito. Juntava-se ao Clube Internacional do Recife, que vinha do século anterior e ainda hoje resiste ao tempo e às dificuldades.



ATA DA FUNDAÇÃO

Aos sete de Abril de mil novecentos e um – 1901 – em o primeiro andar, número um do Caes da Companhia Pernambucana, por convite do Snr. João Victor da Cruz Alfarra, compareceram o mesmo e mais os srs Antonio Dias Ferreira, Esmeraldo Gusmão Wanderley. AS. Ommundsen, Oswaldo de Barros Lins e Silva, Francisco Joaquim Ferreira, João Vieira de Magalhães e Francisco Leandro Rocha. Sendo aclamado Presidente da reunião o sr. Antonio Dias Ferreira assumiu a cadeira e declarou aberta a sessão, nomeando para 1º Secretário o sr. Piragibe Haghissé, e para 2º dito o sr. Francisco Joaquim Ferreira, e para Thesoureiro o sr. João Vieira Magalhães. O sr. João Alfarra pedindo a palavra expoz o motivo da presente reunião o qual é de fundação de uma sociedade para diversões náuticas com a denominação de Clube Náutico Capibaribe – como a idéia foi por todos aprovada, pelo que o mesmo sr. Alfarra apresentou mais as seguintes propostas: Que todos os sócios admitidos até o dia da instalação definitiva do Clube, fossem considerados instaladores. Que a jóia de cada um será da quantia de dez mil réis – 10$000 – e a mensalidade de trez mil réis – 3$000 –, que o pavilhão da sociedade será uma bandeira de dez pannos, o superior e o inferior encarnados e o do centro branco com as letras C N C, iniciaes do Clube em pano azul e também para distinctivo das embarcações do Clube e dos sócios, e que será usado na proa das mesmas, um pequeno – jeck – encarnado com um círculo branco no centro do qual terá em azul uma ancora e as iniciaes do Clube, que todos os presentes se obrigassem a angariar o maior número de sócios para apresental-os na próxima sessão, sendo os mesmos considerados instaladores. Em seguida o sr. Presidente nomeou uma Comissão composta dos srs. Alfarra, Ommundsen, Oswaldo, Ferreira e Piragibe, para confeccionar os respectivos estatutos, devendo apresental-os na próxima sessão. O sr. Alfarra, usando ainda da palavra, agradeceu aos presentes terem aceitado o seu convite comparecendo à presente reunião. O sr.Presidente declarando fundado  o “Clube Náutico Capibaribe”  - marcou o dia 14 do corrente para proceder a eleição da Diretoria definitiva. E nada mais havendo a tractar levantou a sessão, e eu Piragibe Haghissé 1º secretário lavrei a presente acta que será assignada depois de aprovada. Assignados – Antonio Dias Ferreira – presidente. Piragibe Haghissé 1º - secretário.

VITÓRIA SOBRE O SPORT

Nos primeiros anos de atividades, o novo clube resistiu à prática do futebol, que estava virando moda pelo Brasil afora, só aceitando-o mais tarde, diante da ameaça de perder muitos sócios-atletas para o coirmão Sport. Este, nascido visando à prática futebolística, crescia assustadoramente, uma vez que o esporte trazido da Inglaterra começava a cair no gosto da população, principalmente da juventude.
Fundado especificamente para praticar o remo, o Clube Náutico Capibaribe só veio a aderir ao futebol em 1909, oito anos depois de fundado. Seduzidos pelo jogo da bola, associados do Alvirrubro começavam a se bandear para os lados do Rubro-Negro, surgido em 1905.


O Náutico, como se sabe,  reagiu desde os primeiros momentos à prática do novo esporte. Liderada por Bento Magalhães, um dos fundadores, a maioria dos diretores era contrária à implantação da nova atividade esportiva, alegando que o clube tinha sido criado com a finalidade náutica. Além disso muita gente não achava graça em ver um bando de marmanjos vestindo calções, correndo atrás de uma bola.
            A turma mais jovem, composta quase toda de remadores, não pensava assim. Alguns daqueles rapazes começavam a se misturar aos jogadores rubro-negros para participar dos treinos que se realizavam na campina do Derby. Para não perdê-los, o Náutico, por decisão do presidente Ernesto Pereira Carneiro, terminou aderindo ao futebol. Numa Assembleia Geral realizada em 14 de julho de 1909 houve a reforma dos estatutos e foi criado o Departamento de Esportes Terrestres, cuja direção coube a Camilo Pereira Carneiro, irmão do presidente do clube.
            Na sua edição de 12 de maio daquele ano, o Jornal Pequeno já fazia uma pequena referência à adesão do Náutico ao futebol, dizendo: “Consta-nos que os rapazes do Náutico tratam de formar um eleven para bater-se com os do Sport Club”.
            O mesmo jornal, em 21 de junho, voltava a falar sobre o futebol alvirrubro, agora oficializado, como relatou o pesquisador Carlos Celso Cordeiro, na primeira parte do seu Náutico – Retrospecto de Todos os Jogos. Eis a nova notícia:
            “Houve hontem no magnífico ground do Derby o primeiro match-training dos estimados rapazes do Náutico. Às 5 horas da manhã lá estavam já todos os moços que deviam parte no jogo, alegres e promptos para entrar em combate. Foram logo designados os lugares dos jogadores que tomaram lugar no match-training. Pertencem a este team os arrojados foot-ballers: R.Maunsell, Hermann Ledebour, João Drayer e Artur Lundgren. Os ensaios terminaram pouco depois das 8 horas da manhã, deixando a melhor impressão ao sr. R. Mausenll, instructor dos moços. Serviu de referee o sr. Hermann Ledebour. Damos parabéns aos rapazes do Náutico pelo bonito começo no foot-ball”.
            Assim que decidiu acatar o futebol, o presidente Ernesto Pereira Carneiro acertou um amistoso com o Sport. Assim, no dia 24 de julho de 1909 era disputado o primeiro Náutico x Sport, hoje chamado de Clássico dos Clássicos, e que este ano completará cem anos.
            O jogo foi realizado no British Club, na área onde se situa o Museu do Estado de Pernambuco, na confluência da Av. Rui Barbosa com a Rua Amélia e atraiu um grande público. Apesar de ser um principiante, o Náutico venceu o duelo com os veteranos rubro-negros pela contagem de 3 x 1, o que causou uma imensa surpresa. Os gols alvirrubros foram assinalados por R. Maunsell (2) e Thomas.
            Na notícia do jogo, o Jornal Pequeno anunciava que o Náutico vestiria camisa branca com “distintictivo” e calção na mesma cor e utilizaria estes jogadores:

Goal keeper – H. King
Full Backs – E. Montagne Smith e H. A. R. Avila
Half Backs – R. Ramage, F. M. Ivatt e John Cock
Fowards – A. Silva, H. Grant Anderson, R. Maunsell, D.Thomas e João Maia.
Reserva – Mc Pherson.
Line’s man – A. Chalmers

O Sport, de camisa encarnada e preta e calção branco, alinharia:

Goal keeper - - L.Latham
Full Backs – N. D. T Oliver e W.H. Muller
Half Backs – Frank Fellows, W. Pickwood e Willie Robinson
Fowards – Alberto Amorim, S. T. Marsh, L. Griffith, C. Chalmers e J. Amorim Jr.
Reservas – O. Von Sostren e A. Lundgren
Line’s man – Guilherme (Aquino) Fonseca  

Predominava num e noutro times a linhagem ou a descendência inglesa.

Começava assim a maior rivalidade do futebol pernambucano.
           



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