Muito juiz para um jogo só
Neco, um conhecido garçom de Caruaru, que entre outros pontos
reinou na antiga Rua São Miguel, no bairro Maurício de Nassau, era aspirante do
Central nos idos de 1933 e ficou na reserva do time principal num amistoso
contra o Santa Cruz.
Central dos velhos tempos |
Naquele tempo, a presença
de uma equipe do Recife na Capital do Agreste constituía um verdadeiro
acontecimento. No caso do Santa, este era bicampeão pernambucano, lutava pelo
tricampeonato e havia levado jogadores consagrados. Só para citar alguns:
Lauro, Esteves, Limoeiro, Walfrido, Carlos Bening, Sherlock e Dadá.
O Central, por sua vez,
contava com Dedé, Raimundo, Zé Dantas, Tutu e Zé de Nane, como destaques. Tutu
e Zé de Nane formavam uma poderosa ala esquerda, conforme se chamava à dupla constituída
pelo meia armador – os times geralmente armavam pelo setor esquerdo – e pelo
ponta-esquerda.
Tutu, craque alvinegro |
Tutu, Zé de Nane e o próprio
Neco ainda defenderiam o clube patativa, cinco anos mais tarde, na primeira
participação do Central no Campeonato Pernambucano, em 1937.
Não era a
primeira vez que o Santinha ia à na época chamada Terra dos Avelozes. Dois anos
antes, em 1931, tinha havido lá um Clássico das Multidões, que deixou toda
aquela região alvoroçada. Vitória do Santa sobre o Sport, seu maior rival, por
1 x 0.
Para a nova exibição no
Agreste, a delegação tricolor viajou de trem. Ao chegar a Caruaru foi
festivamente recebida. Era um empurra-empurra que dava agonia, com os
torcedores querendo ver de perto os craques corais. Os dirigentes do Santa
tinham chegado à cidade dois dias antes para tomar as providências que se
faziam necessárias para um acontecimento tão importante. A recepção oficial foi na sede do Sport Club
Caruaruense, com os tradicionais discursos, banda de música e muito “viva o
Santa Cruz!”
O jogo
realizou-se no campo do Colégio de Caruaru, que estava superlotado. O Santa
Cruz começou mostrando categoria, enquanto o Central fazia o maior esforço para
resistir às suas investidas. No apito estava Tom, um conceituado empregado da
Boxwell, uma poderosa empresa beneficiadora de algodão, que durante muitos anos
imperou na Rua Silva Jardim, bem no centro da cidade.
Por volta dos 25 minutos
de jogo houve um bafafá na área do Central, e os jogadores do Santa Cruz
partiram para cima do juiz, exigindo a marcação de um pênalti. Até o presidente
do Santa, o brigão Alcides Lima, pai do ponta esquerda Siduca (Santa) e do meia
Alcidésio (Náutico), entrou em campo. O árbitro Tom perdeu a paciência e caiu
fora:
– Sabem de uma coisa?
Tomem essa porcaria e apite quem quiser.
Dito isto, jogou
o apito nas mãos do presidente do Santa e se mandou.
A confusão aumentou e
ninguém se entendia. O Santa Cruz chegou a ameaçar sair de campo. Foi quando o
comendador e milionário José Victor de Albuquerque, presidente do Central, também
entrou na cancha, mas em missão de paz.
O homem forte da Patativa
fez um apelo a Aristófanes de Andrade, um dos notáveis da diretoria tricolor, para
que o Santa Cruz permanecesse em campo, pelo menos, até o fim do primeiro
tempo.
Por sugestão de José
Victor, o próprio Aristófanes assumiu a arbitragem. O Santa chegou ao término
da primeira fase vencendo por 1x0.
A segunda etapa foi
iniciada com outro juiz, Harry Lessa, que fazia parte do quadro de árbitros de
Pernambuco e que estava no campo.
Tudo ia bem até quando o
novo juiz marcou um pênalti contra o Central. Agora foram os jogadores da terra
que acossaram o homem, contestando a marcação da penalidade máxima.
Bate, não bate,
Harry Lessa imitou o primeiro juiz e passou o apito em frente. A missão de
comandar o resto do jogo foi confiada a Zezé Fernandes, o lendário Zezé Rato
Podre, um jogador do próprio Santa Cruz, que não estava em ação naquela
partida.
Os times fizeram um
acordo, e o pênalti não foi batido. O Santa Cruz ainda marcou outro gol. Querem
saber como? De pênalti. Desta vez aceito pelo Central. Assim, o jogo de quatro
juízes e muita confusão chegou ao fim com a vitória do Santinha por 2x0.
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