Toco, Travo e Canela


LENIVALDO ARAGÃO


Campeão pela cabaça



Campeonato Municipal de Cabrobó, cidade situada a 606 quilômetros do Recife, em pleno Sertão do São Francisco. As equipes dos distritos de Mãe Rosa e Manguinha classificaram-se para disputar a honra de levantar a taça e dar a volta olímpica.

Pelo regulamento, meio surrealista, um dos dois times tinha de ganhar. Nada de vantagem de um sobre o outro. O negócio era vencer ou vencer, pois não haveria prorrogação nem cobrança de pênaltis.

Jogo lá e cá, conforme relata o renomado jornalista Cristiano Jerônimo, que já fez parte da equipe esportiva do Jornal do Commercio, testemunha ocular da história, ele que é da Região, pois nasceu em Custódia. Era impossível utilizar a velha retranca, pois, como o campeão teria que sair de qualquer maneira, não adiantaria a ninguém ficar apenas se defendendo.

A torcida acabou se deliciando; Com as equipes jogando um futebol bastante aberto, as investidas se sucediam. E tome rede balançando. Parecia até que os dois técnicos tinham dado feriado aos goleiros.  

Aos 44 minutos do segundo tempo, o placar mostrava um empate de 8x8. Naquele dia o garoto do placar teve trabalho dobrado. Ao pé da letra. Foi aí, ao apagar das luzes, como diziam os narradores, na época em que eu era locutor de pista, que Laerte, o tampa de crush do Mãe Rosa soltou uma chinelada em direção à barra adversária. A bola, de tão maltratada que estava, terminou estourando.

Não havia bola reserva. De um canto a outro do estádio, foi aquele zunzunzum. Adiar o término do jogo só por causa de alguns minutos era algo impensável. Daí, os capitães dos times, depois de muitas confabulações, e de acordo com os companheiros, terem encontrado uma solução sui generis, mas viável, que era encerrar a partida com uma cabaça substituindo a bola.

Cristiano não sabe explicar com que presteza uma cabaça apareceu no campo. Mas, nada de causar admiração, pois em se tratando de uma zona rural, era o que não faltava.
O Mãe Rosa, que estava mesmo com pinta de campeão, foi em frente. Naquele buruçu apareceu Laerte novamente para entusiasmar a galera após uma boa trama de seu ataque.

Chute violento na cabaça, que, entrando na barra de maneira enviesada, bateu no lado interno de uma das traves e quebrou-se, ficando uma parte para dentro e outra sobre a linha fatal.

Surgiu a habitual discussão “foi gol, não foi gol”, até que integrantes das duas equipes resolveram consultar uma autoridade. Tratava-se de veterinário, que, pelo cargo que ocupava, era uma figura respeitadíssima no lugar. Foram buscá-lo em casa.
Por sinal, o veterinário pertencia à família que mandava no Mãe Rosa. O homem foi lá, conferiu, refletiu e sentenciou:
– Se só entrou metade da cabaça é meio gol.

E o jogo terminou com a vitória do Mãe Rosa por oito e meio a oito!

Nosso informante Cristiano Jerônimo, que tinha amizade num lado e no outro, isentou-se de participar das comemorações, mas testemunhou de perto a alegria dos que foram campeões via cabaça.

 
 



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