ESTREIA VITORIOSA E
POLÊMICA PELO BICHO
Finalmente veio a abertura do Campeonato
Sul-Americano Extra. No sábado 5 de
dezembro de 1959, à tarde, o Estádio Modelo, de Guayaquil estava lotado. Inicialmente houve o desfile
das delegações.
Coube ao massagista João de Maria, um ex-jogador do
Santa Cruz, a honra de conduzir garbosamente a bandeira do Brasil. Já seu
companheiro Edmundo Lopes, do Estudante, clube localizado no bairro recifense
do Barro, situado na Zona Oeste da cidade, levava, orgulhosamente, à altura do
peito esquerdo, a miniatura do rinoceronte Cacareco, o símbolo da Seleção.
À noite, a Seleção Cacareco, vestindo a camisa
nacional, fazia sua estreia, enfrentando o Paraguai, o time das camisas
alvirrubras, fazendo lembrar o Náutico e o Bangu, conforme havia afirmado o
técnico Gentil Cardoso numa preleção aos atletas.
Cumprindo o cerimonial houve a execução dos hinos
dos dois países, a cargo de uma banda militar. Os jogadores da Cacareco foram delirantemente
aplaudidos porque não se limitaram a ouvir a banda tocar, mas cantaram o Hino
Nacional Brasileiro do começo ao fim. Os aplausos da torcida equatoriana atestaram
o acerto do treinador em providenciar as aulas musicais nos preparativos da
Seleção.
Antes do jogo havia alguma apreensão entre os
atletas, mas a Canarinha derrotou o Paraguai
por 3x2.
ARRASO DE ELIAS E “HAT-TRICK”
DE PAULO
Foi uma partida emocionante, e o ponta-esquerda
Elias, o baiano Elias Caixão, do Náutico, constituiu-se na maior figura do jogo,
merecendo muitos elogios da imprensa sul-americana. Porém, o centroavante Paulo
foi decisivo, assinalando todos os gols brasileiros.
O Brasil dominou o primeiro tempo e foi para o
vestiário, no intervalo, vencendo por 2 x 0, gols de Paulo, aos 22 e aos 40
minutos.
O centroavante Paulo (D) estreou fazendo três gols (Reprodução) |
Na etapa complementar, Silvio Parodi marcou os dois
tentos paraguaios, tendo sido um de pênalti, e Paulo voltou a balançar a rede
guarani, fazendo o que hoje é chamado de “hat-trick”, quando o jogador marca
três gols numa partida. A arbitragem foi do equatoriano Boanerges Caballo.
Brasil: Waldemar; Zequinha,
Edson e Givaldo;
Biu e Clóvis; Traçaia, Zé de Melo (Tião), Paulo,
Geraldo e Elias. (Embora tivesse levado os laterais direitos Bria e Geroldo, o
técnico Gentil Csrdoso preferiu improvisar o zagueiro central Zequinha na
posição).
Paraguai: Aguillar; Gonzaga,
Monin e Vilalba; Aguirre e Lescalud; Benitez (Jaro), Insfan, Muñoz, Cabral e
Silvio Parodi.
Devido ao fuso horário equatoriano, de duas horas a
menos, os pernambucanos ficaram até tarde da noite colados aos rádios, acompanhando
as transmissões do jogo.
JOGADORES RECUSAM O
BICHO
Estrear com o pé direito sempre causa alegria,
principalmente quando se trata de uma competição internacional. Portanto, no
dia seguinte à vitoriosa estreai brasileira, no Hotel Majestic, em Guayaquil,
os brasileiros desfrutavam o triunfo, principalmente o vaidoso treinador Gentil
Cardoso, que andava pelos corredores mostrando um largo sorriso.
E o tradicional quadro negro de Gentil, instalado
na sala onde o técnico se reunia com o grupo, trazia uma frase não muito apropriada
para o momento: “Não tire catota em público. É falta de educação”. Rubem
Moreira reprovou a frase, que, como sempre fora escrita por Gentil, e mandou retirar
o quadro.
Em dado momento, o animado, mas sóbrio ambiente da
Cacareco, explodiu. Gentil Cardoso, achando que o bicho de dez dólares pela
vitória sobre os paraguaios era irrisório – como qualquer técnico, ele recebia
dobrado, – instigou seus comandados a recusarem o prêmio. O objetivo era forçar
um aumento na premiação. O treinador argumentava, com muita razão, que se fosse
a verdadeira Seleção Brasileira, jamais seria oferecida uma gratificação, para
ele, tão insignificante.
O administrador da delegação, Jaime de Brito
Bastos, e o tesoureiro De Francicis aguardaram a chegada dos jogadores ao
refeitório para o café da manhã, convidando-os para receber o bicho.
– Quero todo
o mundo com dinheiro no bolso – havia determinado Rubem Moreira, desmanchando-se
em felicidades.
O primeiro jogador abordado pelos pagadores foi o
lateral-esquerdo Givaldo, que recusou o prêmio, sob esta alegação:
– Seu Gentil disse que a gente só recebesse bicho
de 20 dólares.
Rubem
Moreira estava na cama quando foi informado daquela decisão. De cueca mesmo,
como estava, saiu corredor afora, soltando seu palavrório impróprio para
menores e invadiu o quarto de Gentil Cardoso, como uma bala, sem dar ao técnico
nem tempo de respirar:
Rubão perdeu a elegância mostrada no desfie (Reprodução) |
– Quem manda aqui sou eu. Você vai voltar pro
Brasil, e tem mais uma coisa. Quem não receber o bicho vai ser punido. Na sua disparada
verbal, como se fosse uma metralhadora, o intempestivo cartola, externando
nervosismo ao quadrado, não deu o menor espaço para o treinador se
explicar. Enfurecido, berrou:
– Jaime,
convoca Edson (o capitão do time) pra
uma reunião agora mesmo e passa um telegrama a Havelange (o presidente João Havelange, da CBD), pedindo um técnico.
A dupla missão foi rapidamente cumprida, e embora
sem saber, pois achava que se tratava apenas de uma das costumeiras reações
raivosas do cartola, Gentil Cardoso estava caindo.
ANTONINHO DE PRONTIDÃO
A CBD chegou a deixar de prontidão Antoninho,
treinador das seleções de base do Brasil, e que em 1965, na fase do Hexa,
dirigiria a equipe do Náutico no tricampeonato. Porém, a situação terminou
sendo contornada, com o pedido de desculpas do ultrajado treinador. E os
jogadores receberam a gratificação estabelecida pela chefia da delegação, tendo
sido o treinador o primeiro a assinar a folha de pagamento.
Antoninho ficou só na expectativa (Arquivo do blog) |
A bagunça (só isso?) já existe desde aí...
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