Os treinadores Nereu
Pinheiro, recentemente falecido, e Charles Muniz formavam uma dupla perfeita. Estiveram
juntos mais de uma vez. Entendiam de futebol e eram amigos. Nereu agitado, um
olho clínico impressionante, Charles comedido, técnico diplomado, jeito de
sacristão. Por volta de 2005/06 estavam no Sport, que queria quebrar a castanha
do Vitória da Bahia. Este mandava no futebol de base no Nordeste. Deu certo. O
Leão da Ilha levantou a taça de campeão Sub-19 do Nordeste, domando o Leão da
Barra, na final, no Rei Pelé, em Maceió.
Nereu e seus jovens valores (Blog NE10-Uol) |
Algum tempo depois, vieram
os preparativos para a Copa São Paulo, tendo sido programada uma pré-temporada
para dezembro, posto que o torneio paulista inicia-se quase no Reveillon. Nereu tinha sido informado por
um amigo, uma espécie de olheiro, que na região de Paulo Afonso, onde vivia,
havia uma safra de “menino novo”, que não era de desprezar. Era bom ele dar uma
olhada. Foi para lá que Nereu levou sua turma, acompanhado do preparador físico
e assistente técnico de estimação.
O Sport fez vários jogos-treinos
por lá, sempre enfrentando times da mesma faixa. Uma cidade, nas imediações, estava
aniversariando e queria uma exibição dos rubro-negros. O tal observador
intermediou o jogo e o que mais Nereu recomendou, depois de consultar os
dirigentes, no Recife, foi que nenhum jogador poderia ter mais de 19 anos,
idade limite dos juniores.
Jogo festivo, estádio abarrotado,
banda de música, serviço de som animando a torcida e por aí vai.
– Olhe, você me prometeu que
o time só vai botar gente até 19 anos, tá lembrado? – perguntou Nereu ao homem
que acertou o jogo.
– Deixe comigo, pode confiar
– foi a resposta.
O sempre bem-humorado Charles Diniz (Blog NE10-Uol) |
Bola em jogo, Nereu,
nervosamente, chamou Charles, depois de uma jogada do zagueiro central:
– O cara me prometeu botar
jogador até 19 anos e aquele zagueiro tem muito mais. Vá lá e diga que vou
tirar o time de campo.
O assistente de Nereu saiu
correndo pela linha lateral sob vaias dos torcedores e levou a ameaça ao organizador
do amistoso:
– Tenha calma porque ele só
vai jogar 25 minutos. É o secretário de Finanças da Prefeitura e é quem vai
pagar a quota de vocês.
Charles volta e dá a notícia
a Nereu, que pergunta:
– Quantos minutos tem de
jogo?
– Seis.
Momentos depois, o volante da
casa faz um lançamento primoroso e quase sai o gol.
– Charles, vai lá novamente,
que aquele cara já é um coroa.
E era, pois tratava-se do
prefeito. A desculpa foi a mesma. Só jogaria 25 minutos.
Jogo acirrado, disputadíssimo.
Num ataque da equipe local, um meia, parecido com João Grilo, d’O Auto da
Compadecida, efetuou uma bicicleta e por milagre não balançou a rede. A
irritação de Nereu aumentou. Lá vai Charles outra vez, com a intimidação.
– Não tirem o time de campo
porque o jogo tá muito bom. Esse é o padre daqui e vai sair também aos 25
minutos.
Quando soube que o vigário
estava em campo, Nereu botou as mãos à cabeça, fazendo uma careta:
– Era só o que faltava. Já pensou
se o Sport perde, com um gol de um padre? – indagou o inconformado e agoniado treinador.
Logo perguntou a Charles
pelo tempo de jogo. Já eram 23 minutos. Começou a gritar para a meninada:
– Cai, cai um, só faltam
dois minutos.
Só que os jogadores não
sabiam o que estava acontecendo e não entendiam nada. Até que houve uma falta a
favor do Sport, com o atleta rolando no chão. O jogo foi naturalmente
interrompido, e os falsos juniores deixaram o campo, para alívio de Nereu. E o
Sport terminou ganhando o jogo.
Essa é ótima! Esperei gol do padre com passe do prefeito...
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