A hilariante tática do técnico Modesto do Carmo






No seu livro “Causos da Bola”, o mineiro Victor Kingman conta a história de Modesto do Carmo, um técnico do Interior:

“Nunca em sua história, a modesta equipe do Barreirão tinha ido tão longe em uma competição: estava na final da liga regional. Todos os habitantes da pequena cidade de Barreira se orgulhavam do feito e não se falava em outra coisa por toda a redondeza.

Formada apenas por esforçados jogadores, e sem nenhum craque, já havia vencido todos os principais favoritos ao título e estava a uma vitória da tão sonhada glória. Tinha na garra e na determinação com que disputava as jogadas, a sua grande virtude. Tudo sob a batuta do folclórico técnico Modesto do Carmo, com seus métodos nada convencionais de transmitir suas orientações, muitas vezes com palavras impublicáveis.

Costumava dizer: meu nome é Modesto do Carmo. Modesto eu posso ser, mas Carmo não!
Se não seguirem minhas orde, fico nervoso mesmo... e sorto os cachorros!...

E este linguajar de seu técnico estava deixando sem sono a diretoria do Barreirão e até o prefeito local, pois, afinal, a partida seria transmitida pelo rádio para toda a região. Zelosos pela imagem da cidade e preocupados com o que poderia falar nas entrevistas, resolvem substituí-lo, logo na grande decisão. E contrataram, para seu lugar, um famoso técnico da capital, daqueles de paletó e gravata e fala empolada.

Chega o grande dia... Terminado o primeiro tempo, o Barreirão parece irreconhecível: 3x0 para os visitantes. Atordoados, os jogadores não conseguiram assimilar as orientações técnicas e variações táticas sugeridas pelo ‘professor’, que propunha mudanças alternadas do sistema 4-2-4 para o 3-5-2, com overlaping, pelas laterais...

Atendendo ao apelo desesperado da torcida, que urrava pelo velho Modesto, o presidente do clube tentou a última cartada:
– Busca o homem!

E, pela primeira vez na história do futebol, um técnico foi substituído no intervalo...
E nosso herói, que assistia ao jogo da arquibancada, volta à cena, irrompendo pelo vestiário, já disparando suas máximas a torto e a direito:
– O time tá muito manso. Parece pardal de igreja!
– E o capitão, muito calado! Precisa bancar o cabrito entrando na faca: berrar o tempo todo!...
– Zagueiro tem que jogar quiném pé de milho: plantado!
– E tem mais: atacante inimigo é feito cabeça de prego. Tem que levar pancada até sumir da sua frente!
– Meio de campo não pode enrolar... tem que distribuir a bola igual a rabo de vaca: prum lado e pro outro...!
– A linha tá paradona! Esqueceu da tática do ‘tatu com porco?’ É cavar e fuçar o tempo todo...!
E arremata furibundo:
– Quando nóis tiver sendo atacado, arrecua todo o time...!
– E na hora de ataque é quiném enterro de Coronel: vai todo mundo!...

Final de jogo: em memorável virada, o Barreirão vence o jogo por 4x3, com o nosso bravo Modesto do Carmo sendo carregado em triunfo, nos braços, pela torcida...       
Um pouco menos ‘Modesto’ e mais ‘Carmo’ que nunca.

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