BOLA, TRAVE E CANELA/Lenivaldo Aragão

 DUQUE, FUMACÊ E GALINHAS PRETAS


 


O técnico Duque, como se sabe, usava de todos os expedientes a seu alcance para ganhar um jogo. Cercado de mistérios por todos os lados, não dispensava um toque do Além. Durante o campeonato, usava a mesma camisa surrada, bem como um par de meias, cada pé com uma cor diferente. No Náutico sempre recorreu aos serviços de Pai Edu. Este ia frequentemente à concentração da Rua Santo Elias, no Espinheiro, dar umas baforadas nos jogadores e no próprio treinador para espantar o azar.

No Santa Cruz, Duque tinha um irmão de fé, que era o célebre Waldomiro Silva, através do qual entrosou-se com duas mães de santo, chamadas Severina e Maria. Isso na segunda vez em que esteve no Arruda, no início dos anos 80.

Sempre que o Santinha tinha um compromisso importante a saldar, Waldó providenciava a ida de uma delas ou mesmo das duas à concentração tricolor, em Aldeia, chamada Ninho das Cobras. Cobrinha, motorista do clube, era o encarregado de ir buscá-las, mas o massagista João de Maria também participava do ‘trabalho’.

Entre os jogadores havia os que acreditavam na força dos trabalhos e outros que não queriam nem saber. O ponta-esquerda Joãozinho era da turma do contra. Ficava aborrecido com a fumaça que se espalhava pela sala quando os charutos entravam em cena.

Sempre existia um que queria se divertir com as sessões. Era reprimido pelo treinador, com a força de sua autoridade:

– Quem gostar, tudo bem, que acompanhe a devoção. Agora, quem não gostar não venha com brincadeira.

Numa dessas reuniões, uma das mães de santo colocou a mão na cabeça do meia Sena, e o atacante começou a tremer. Para os descrentes, uma mera brincadeira, mas para os crédulos, um bom sinal. Como se tivesse acertado na mosca, Duque dirigiu-se a Waldomiro:

– Waldó, eu não disse que o time tava carregado?

Na véspera de um clássico com o Sport, as duas encomendaram galinhas pretas, velas e outras coisas mais. Houve o ritual de sempre, com as penosas sendo mortas e usadas no “serviço”. Depois veio a ordem de atirar as aves numa mata virgem em noite alta. Cobrinha e João de Maria encarregaram-se da missão e para dar mais força ao ato, jogaram as galinhas mortas, às escondidas, é claro, no terreno onde se localizava a concentração rubro-negra, que ficava nas imediações do Ninho das Cobras.

Só que o tiro saiu pela culatra, ou seja, o feitiço virou contra o feiticeiro. No Clássico das Multidões, vitória do Leão por 2 x 1. Cobrinha e João de Maria ficaram na moita sem contar nada a ninguém, pois certamente seriam considerados culpados pela “virada”.

Duque, aliás nem chegou a completar o campeonato. Era a fase do tri do Sport em 1980/81/82 e não havia galinha preta ou fumacê que segurasse o time rubro-negro.

     

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