HISTÓRIAS DO CLÁSSICO DOS CLÁSSICOS

UM BODE NOS AFLITOS E A PROPOSTA QUE LOLITA RECUSOU

 



Dia de clássico decisivo, é hora de aliviar a tensão de torcedores do Náutico e do Sport. Chega de nervosismo. Vamos ajudar os adeptos dos dois clubes a se descontraírem, contando duas histórias engraçadas sobre um dos duelos mais antigos do futebol brasileiro, dentro do espírito que norteia este blog.

Sempre trazemos relatos de fatos verdadeiros, procurando explorar o lado pitoresco e humorístico, tão ao gosto da galera. É isso o que estamos fazendo. São dois casos, ambos tendo como protagonista o famoso Trio CBF, formado por três dirigentes do Sport, cuja finalidade era realizar a tradicional greia para fazer rir e tirar o sossego do seu tradicional adversário.

 



O JOGO DO BODE

Hexacampeão pernambucano, o Náutico, em 1969, tentava o heptacampeonato, embora estivesse nas últimas, dando mostras de que já não tinha fôlego para tanto. Terminaria sendo desbancado pelo Santa Cruz, que iniciaria a trajetória do pentacampeonato. Na pior, o Sport mudava constantemente de técnico e de jogadores para, no fim, ver os outros fazerem a festa.

Haveria mais um Clássico dos Clássicos, e um trio de dirigentes rubro-negros, que tudo fazia para infernizar a vida dos alvirrubros, procurou o repórter Amaury Veloso, do Diário de Pernambuco, mais tarde assessor de imprensa do Leão. Queriam que o jornalista os levasse à presença do pai-de-santo Edu, morto em maio de 2011. Edu vangloriava-se de ter dado o Hexa ao Náutico, com seus banhos de sal grosso, arruda, coisa e tal, tudo dedicado à entidade chamada Zé Pilintra.

Certo dia, lá se foi Amaury, que na época cobria o Sport para o DP, ao Palácio de Iemanjá, em Olinda, com José da Silveira Barros, conhecido por Coca, João Brito e Fernando Samico, todos figuras de proa no departamento de futebol do clube da Ilha do Retiro. Formavam o Trio CBF – Coca, Brito e Fernando. Havia outra sigla dedicada a eles, que era o DC – Departamento de Caralh...

Com os três, não somente o Náutico, mas também a Federação Pernambucana de Futebol, comandada pelo folclórico Rubem Moreira, não tinha paz.

A missão do Sport naquele jogo era espinhosa porque o Náutico fazia cinco anos e três meses que não perdia nos Aflitos, a sua casa. A última derrota ali tinha sido em 9 de dezembro de 1963 para o Santa Cruz. Então, era necessário apelar para os poderes sobrenaturais visando derrubá-lo.

 Jogo num domingo, 30 de março de 1969. Foi passado o bizu por Edu, ou seja, como o trabalho para quebrar o encanto do Timbu seria feito. Porém, o pessoal queria se garantir mais e resolveu, por sugestão de Samico, aprovada pelo pai-de-santo, botar um bode em cena. Da fazenda de Coca foi enviado um caprino para o Recife, o qual ficou sob cuidados de Gaguinho, o zeloso gerente da concentração rubro-negra no terminal de Caxangá.

Debaixo de sete capas, eles levaram o quadrúpede para o estádio, depois de uma parada na casa de Samico, no bairro dos Aflitos, portanto, pertinho do palco da luta, o Estádio Eládio de Barros Carvalho.

Pouco antes de as equipes entrarem em campo, Ilo, um ex-centroavante do Sport, jogou o bicho, envolto num pano com as cores alvirrubras, por cima do alambrado do lado da sede do clube.

O animal ficou espantado e começou a correr em meio a uma grande gritaria que o deixava mais perturbado ainda. Uns achavam que se tratava de mais uma jogada do técnico Duque, acostumado a apelar para o Além, via Pai Edu. Outros, que conheciam de perto o Trio CBF, pensavam que tinha partido dos três a tal presepada. Ou seria mesmo um “serviço” do outro lado para anular algum reforço espiritual do Leão?

A verdade é que o bode ficou atarantado, correndo em várias direções. Em vão tentaram pegá-lo. Os fotógrafos perseguiam-no. O coitado do animal mostrava-se, cada vez mais, tomado de pavor com o alarido da multidão.  Até que entrou na barra que fica no lado da Rua da Angustura. Ficou embaralhado na rede. Mais risos dos torcedores. Muitos gritos triunfantes, como se aquele povo que enchia as arquibancadas dos Aflitos estivesse em mais um show de vida ou morte na antiga arena romana. Dmorou, mas conseguiram tirá-lo dali.

 O epílogo dessa história é que a invencibilidade do Náutico em seu campo foi quebrada com um gol contra – o jogo terminou em 1 x 0 - marcado naquela mesma barra em que o caprino se enganchou. Gol de Newton dos Santos, um quarto-zagueiro clássico, que tinha sido do Sport e enfrentava seu ex-time pela primeira vez.

Vista parcial do Estádio dos Aflitos (Foto NáuticoNET)


Depois de ter sido vice-campeão seis vezes, o Sport viu o Santa fazer a festa cinco anos seguidos. Foi quando o Náutico evitou o sexto título tricolor, em 1974, o que levou à criação do célebre “Hexa é Luxo”.  Só em 1975, quando estava para entrar no 13º ano sem ser campeão, é que o Rubro-Negro acabou com a mumunha, para a qual um bode só tinha sido pouco; talvez um rebanho.

A REAÇÃO DE LOLITA

Esta encontra-se no meu livro “Comigo ou Sem Migo” e tem este desenrolar:

“Os dirigentes Fernando Samico, João Brito e João da Silveira Barros (Coca) – ex-vereador do Recife – viviam sempre aprontando para cima do Náutico, tendo, inclusive, feito um bode entrar no Estádio dos Aflitos, num dia de casa cheia, conforme está contado em outro capítulo deste livro. Os três, conhecidos como o Trio CBF, tinham outro apelido, bem mais apropriado à sua atividade nos bastidores do futebol, mas impublicável. Com o Náutico no auge, na época do hexacampeonato, eles viviam sempre engendrando alguma coisa para perturbar a vida da timbuzada.

E, de uma certa feita, recorreram a Lolita.

Para quem não o conheceu, Lolita foi um homossexual, tipo tranca ruas, versão pernambucana do também pernambucano Madame Satã, igualmente homossexual, que reinava na zona boêmia do Rio, especialmente no decantado bairro da Lapa.     

 – Quem não conhece Lolita não conhece o Recife – a frase foi celebrizada pelo próprio Lolita, figura conhecidíssima e até temida, mas ao mesmo tempo amada e admirada pelos recifenses.

Não era difícil vê-lo a qualquer hora, do dia ou da noite, na calçada do Bar Savoy ou em outra parte do centro da cidade, com seus trejeitos, cantando músicas de Ângela Maria, como ‘será que eu sou linda? Você é um amor!’ Sem ser convidado, sentava-se à mesa de qualquer um e pedia:

– Paga um chope pra Lola! – no que era atendido. Entre goles, lorotas e disparates, divertia os circunstantes.

Era preciso ter cuidado para conversar com ele. Em momentos em que, diziam, estava meio fora de si, ficava furioso, e ai de quem resolvesse molestá-lo. Foram célebres seus pegas com a Rádio Patrulha, que o dominava, mas só depois de muito trabalho.

– Quem quer bem maltrata – ou – bate nesse corpo que já foi teu – eram frases de Lolita nos duelos com os patrulheiros, o que provocava risos do público e mais irritava os soldados.

Foi a Lolita, portanto, que o Trio CBF recorreu, em certa ocasião, no sentido de mais uma vez azucrinar os alvirrubros.

Os três procuraram a fera, que, apesar de suas incursões por outras áreas recifenses, sentava praça no Recife Antigo, onde funcionava o chamado baixo meretrício.

Após localizar Lolita, fizeram-lhe uma proposta. Em dia de Sport x Náutico, ele deveria entrar em campo com a camisa do Náutico. Para isso seria muito bem pago. O objetivo era demonstrar que ele torcia pelo Timbu.

Lolita prontamente recusou a empreitada e tirou logo o trio de tempo:

 – De jeito nenhum. Se eu torço pelo Sport, como é que vou vestir a camisa do Náutico?

  

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