HISTÓRIAS DO LENDÁRIO PALMEIRA (4)

O cravo branco do Náutico gerou pânico na Ilha



Lenivaldo Aragão

Náutico em jogo nos Aflitos. Em pé, Zequinha, Waldemar,  Zé Luiz, Evandro, Gilson Costa e Clóvis; agachados, Nado, Bita, China, Ivan e Rinaldo  (Reprodução Internet)



Houve uma época em que a concentração do Náutico ficava na Rua Santo Elias, em pleno coração do bairro do Espinheiro, um salto para os Aflitos. Os jogadores iam e vinham a pé. Alguns moravam ali mesmo.

Num domingo de verão, o Náutico ia enfrentar o Sport na Ilha do Retiro. O pessoal caminhava em direção aos Aflitos a fim de trocar de roupa e entrar no ônibus que o levaria ao estádio rubro-negro, todos já uniformizados para o Clássico dos Clássicos. Um grupo formado por Ivan, Rinaldo, Gilson Costa, China e Paulinho seguia a passos lentos, jogando conversa fora. Na calçada de um dos muitos casarões que compunham o cenário da época, justamente onde morava um alvirrubro de destaque, o deputado Olímpio Mendonça, havia um belo jardim. Do muro pendia um bonito cacho de cravos brancos que chamou a atenção da turma. Gilson Costa lembrou-se de que o técnico Palmeira, do Sport, com quem já havia trabalhado – tão supersticioso e chegado a um catimbó quanto seu adversário  Duque, do Náutico – tinha àquela flor. Quem o conhecia de perto sabia como Palmeira era ligado nessas coisas. Havia um pai de santo para os lados do Barro, chamado Zé da Bola, que ele consultava frequentemente. Jogo correndo, quem sentasse perto dele, no início da partida, teria que ir até o fim. Também ninguém podia chegar mais. Para não quebrar a corrente.

Naquele início de tarde, diante do bizu passado por Gilson, o lateral Paulinho resolveu colher um cravo, só para fazer uma gréia. Ficou decidido que a flor seria atirada na barra do Sport, assim que fosse tirado o toss. A missão foi confiada ao ponta-esquerda Rinaldo, que pouco tempo depois jogaria pelo Palmeiras, Seleção Brasileira e outros clubes.

O sorteio indicou o lado do placar para os rubro-negros defenderem. Quando os jogadores das duas equipes já tomavam posição, Rinaldo foi até lá e atirou o cravo branco. Formou-se um banzé que não estava no gibi. Diferentemente de hoje, os bancos dos dois técnicos ficavam atrás daquela barra, justamente na boca do túnel. Apavorado com a cena, o crédulo Palmeira foi logo gritando:

– Maior do que Deus, ninguém!

Ele mesmo determinou que ninguém pegasse naquela flor maldita. Seus jogadores não deveriam chegar nem perto. Palmeira não tinha a menor dúvida de que se tratava de “coisa feita”. Não só o treinador do Leão, mas todos os que estavam no estádio, pois era público e notório que o pai de santo Edu trabalhava para Duque.

A Ilha viveu alguns minutos de pânico e apreensão. Ninguém tinha coragem de se aproximar da barra do cravo. Enquanto o medo rolava entre os rubro-negros, os jogadores do Náutico divertiam-se com a situação. E nada do jogo começar. Passou-se um tempão até que o massagista Zé Ramos, do Sport, que se dizia de corpo fechado, desse uma de herói e tomasse a decisão de encarar o perigo. Dirigiu-se à barra amaldiçoada e cuidadosamente apanhou o cravo branco, evitando tocar-lhe diretamente, e atirou-o para fora do campo por cima do alambrado.

Efeito da macumba de araque, ou não, o certo é que o Náutico venceu o clássico por 3 x 2, com o gol da vitória  marcado pelo centroavante China (já havia assinalado um), justamente na tal barra. Ninguém tirou da cabeça de Palmeira que aquilo tinha sido arte de Zé Pilintra, o ‘santo’ de Pai Edu. Este, mais tarde, malandramente posou de autor do ‘serviço’, quando se tratou de uma mera gaiatice da rapaziada do Timbu.

 

 

 

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