HISTÓRIAS DO MUNDO DA BOLA-Lenivaldo Aragão

 Preso no quartel, o recruta Dufles não pôde mais defender o Náutico


Dufles, sorridente, e o penúltimo agachado na equipe de aspirantes do Santos. Pelé, com quem começou no Baquinho, é o segundo  (Reprodução)

 Quando dirigia o time do Náutico em fins dos anos 50, o uruguaio Ricardo Diez trouxe quatro jogadores de Minas Gerais: Colorado, volante; Otacílio, meia-armador; Vado, ponta-de-lança; e Dufles, centroavante. Este, tinha a seu crédito o fato de ter pertencido ao Baquinho, o juvenil do Bauru Atlético Clube, onde jogou ao lado de um atacante arisco  que mais tarde se consagraria com o apelido de Pelé. Como Pelé, Dufles chegou a ser levado para o Santos pelo olheiro que descobriu o “Rei”, Waldemar de Brito. Porém, ao contrário do menino nascido na mineira Três Corações, não se firmou na Vila Belmiro. Tinha uma vida meio embaraçada. Antes de vir para o Náutico, defendeu outras equipes, entre elas o Bangu-RJ, o Marcílio Dias-SC e o Atlético Mineiro.

Conta-se que certa vez ele levou uma vaia da torcida do Marcílio Dias e respondeu baixando o calção no meio do gramado. Noutra ocasião entrou numa briga enquanto esperava o trem numa estação, com sua equipe.

Ao chegar ao Recife para defender o Timbu, Dufles deparou-se logo com um problema. Era refratário, ou seja, estava devendo o serviço militar e sem estar quite com o Exército não poderia ser registrado na Federação Pernambucana de Futebol. Assim, teve que servir à Pátria, mesmo com atraso de alguns anos. Dufles foi lotado no quartel de Cinco Pontas, onde está hoje o Museu da Cidade do Recife. Morava na pensão de Estelita, na Rua da Glória, bairro da Boa Vista, que abrigava outros jogadores do Náutico.

Tudo corria normalmente para Dufles, que, sendo jogador, gozava de algum privilégio na caserna, pelo menos no que se refere às facilidades para sua presença nos treinos. Também, naqueles tempos só se treinava uma vez por dia, o que já facilitava tudo. Aliás, quem introduziu o hábito de treinamento em dois expedientes em Pernambuco foi Duque, de várias passagens pelo Náutico, Santa Cruz e Sport.

Boêmio, Dufles podia ser visto todas as noites na vida alegre do Pina, tomando cuba-libre e ouvindo Agostinho dos Santos, com quem se dava bem, uma vez que o cantor, adepto do futebol era ligadíssimo ao pessoal do Santos. Estava sempre cercado de amigos e geralmente pagava a conta. Dentro de campo ia agradando.

Aqui uma formação do Náutico com ele no time: Waldemar; Jurandir, Zequinha Miná (Lula), Givaldo (Nancildo) e Helmíton; Colorado e Gilson Costa; Mário, Geraldo, Dufles (Maurício) e Elias (Fernando). Amistoso nos Aflitos em 26/5/1959, contra o Fluminense, que se encontrava em excursão pelo Nordeste. Empate por 2 x 2, gols de Dufles e Elias, o célebre Elias Caixão, para o Timbu. Arbitragem do português Anísio Morgado.

Dufles tinha uma irmã, doente mental, que vez por outra fugia de casa e dava aquele trabalho. A família morava no interior de São Paulo, e certo dia chegou um telegrama, pedindo a presença urgente do centroavante em casa. Mais um desaparecimento da mana. Ele conseguiu licença de oito dias junto ao Náutico e ao Exército, passou do prazo. e em vez de avisar aos seus superiores no quartel, não deu a mínima. Com o clube foi fácil resolver. O quartel não tinha qualquer informação dele. Dias depois, o Exército tomou conhecimento de sua volta pelo noticiário do Náutico que saía nos jornais, com ele em atividade. E nada de Dufles se apresentar.

Um belo dia, o ex-companheiro de Pelé ainda estava tomando o café da manhã, na pensão, quando foi agarrado por uma patrulha. Pelas leis da caserna foi considerado desertor e pegou um ano de cadeia. O Náutico teve que procurar outro centroavante. Adeus bola, adeus vida noturna do Pina, adeus, cuba-libre. Cheguei a visitá-lo na cela onde cumpria a pena, em Cinco Pontas. Depois que foi solto deu nos calos e nunca mais se ouviu falar nele.

Nascido em 1938, em Bauru, Dolphe Jerônimo Adalberto do Couto morreu em novembro de 2004, com 66 anos.

 

 

 

 

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