HISTÓRIAS DO MUNDO DA BOLA - Lenivaldo Aragão

 

Reprodução Agência Estado




A guerra parou para o povo ver Pelé jogar



Por Gabriel Pierin, do Centro de Memória


 


Em 4 de fevereiro de 1969, uma terça-feira, a Guerra de Biafra parou para o povo nigeriano ver o Santos jogar. Em partida que não tinha sido programada pelo empresário Samuel Ratinoff e só foi decidida após o Santos ter recebido garantias de que sua permanência seria segura, o Alvinegro Praiano jogou em Benin, quase na fronteira da Nigéria com a região separatista de Biafra, e venceu a Seleção do Meio Oeste por 2 a 1, entrando para a história como o primeiro time a interromper um conflito armado.

Menos de dois meses antes, em 10 de dezembro de 1968, o Santos havia derrotado o Vasco, no Maracanã, por 2 a 1, e conquistado o título do Torneio Roberto Gomes Pedrosa de forma incontestável. Era o seu sexto título brasileiro. Jornalistas do Brasil inteiro reconheciam a supremacia santista no Brasil. Tanto que, ao assumir a Seleção Brasileira, no início daquele mês de fevereiro, o técnico João Saldanha anunciou nada menos do que nove santistas entre os convocados para as Eliminatórias da Copa do México.

A Confederação Brasileira de Desportos (CBD), em conflito com a Confederação Sul-americana, havia decidido que Santos e Internacional, campeão e vice do Brasil em 1968, não participariam da Copa Libertadores de 1969. Não era a primeira vez que a oportunidade de disputar o torneio continental era preterida por clubes brasileiros. 

Na verdade, para os dirigentes santistas, financeiramente era muito mais vantajoso ganhar em dólares por amistosos no Exterior do que encarar uma competição deficitária, em que a renda era do clube mandante.

Então, o Santos partiu para uma sequência de jogos na África que se revelaria histórica. As primeiras exibições ocorreram na República do Congo. Na ocasião, o Congo estava dividido em dois países em litígio, que não mantinham relações diplomáticas. O Santos se viu obrigado a jogar nos dois, em eventos marcados pela alegria dos africanos por ver Pelé.

Depois de passagens por Lagos, na Nigéria, e Lourenço Marques, em Moçambique, o clube foi convidado para retornar à Nigéria. Dessa vez, o jogo seria em Benin, cidade próxima à fronteira com a região separatista de Biafra, epicentro de uma sangrenta guerra civil.

A delegação santista estava acompanhada do jornalista Gilberto Marques, de A Tribuna. Segundo ele, o tenente-coronel Samuel Ogbemudia, governador da região, liberou a passagem pela ponte que ligava Benin à cidade de Sapele. Além disso, decretou feriado depois do meio-dia para que as pessoas pudessem assistir ao jogo.

Cerca de 25 000 pessoas compareceram ao estádio naquele 4 de fevereiro. Pelé foi homenageado com flores. O jogo contra a Seleção do Meio Oeste terminou com a vitória santista por 2 a 1, com gols de Edu e Toninho. O técnico Antônio Fernandes, o Antoninho, escalou a equipe com Gylmar (Laércio), Turcão, Ramos Delgado, Joel Camargo e Rildo (Oberdan); Lima e Negreiros (Marçal); Manoel Maria, Toninho (Douglas), Pelé (Amauri) e Edu (Abel).

O Santos ainda seguiu para Gana e Argélia antes de retornar ao Brasil. O legado que o Peixe deixou no continente se faz sentir até hoje, dada a simpatia que os africanos possuem pelo time, pelo futebol brasileiro e por Pelé.

 

 

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