Ademir & Cia (1): Quando o Sport desbravou o Centro-Sul



(Um episódio empolgante na saga do Sport Club do Recife é aqui revivido, em capítulos)

No fim de 1941, a torcida do Sport ainda comemorava a conquista de mais um título de campeão pernambucano, desta vez com o carimbo de invicto e com um gostinho extra: a campanha foi encerrada com uma goleada de 8 x 1 sobre o Náutico, o maior rival do time rubro-negro.

O Leão seria também campeão nos dois anos seguintes, conquistando, assim, o segundo tricampeonato de sua história. O primeiro tinha sido levantado no triênio 1923/24/25. Como as atividades do futebol em Pernambuco estavam paralisadas, os dirigentes pensavam na melhor solução para manter o elenco em atividade, uma vez que só lá para março ou abril de 1942 é que a bola voltaria a rolar oficialmente nos gramados do Recife. Naquela época, o Campeonato Pernambucano cingia-se aos clubes da Capital.

UMA PARTE DA SELEÇÃO

Havia na diretoria quem fosse favorável à liberação dos jogadores, a exemplo do que acontecera com o Náutico, mas o clube, usando o prestígio do seu técnico, o uruguaio Ricardo Diez, conseguiu uma excursão ao Centro-Sul. Com isso, o Leão permaneceria com sua equipe em movimentação e obteria dinheiro suficiente para pagar os salários dos atletas. Era a primeira vez que uma equipe de Pernambuco iria além da Bahia. A notícia alvoroçou a torcida e ganhou destaque na imprensa.

Àquela altura, a Seleção Pernambucana encontrava-se no Rio de Janeiro, participando do Campeonato Brasileiro, e dela faziam parte nove profissionais do Sport: Manuelzinho, Zago, Ademir, Pirombá, Furlan, Pitota, Djalma, Mulatinho e Clóvis. Isso, sem dúvida, era meio caminho andado para que o giro leonino se concretizasse. Começava pela economia nas passagens de ida, pelo menos até a então Capital Federal. Logo, o presidente Luiz Oiticica convenceu-se do acerto da excursão.

Assim, no dia 5 de dezembro, o que restava da equipe rubro-negra embarcava no vapor Cantuária. O avião ainda não havia se popularizado, e a viagem marítima era comumente utilizada pelas delegações esportivas para os deslocamentos mais longos.

Em pé: Pitota, Furlan, Castanheira (América), Salvador (Náutico), Manuelzinho e Zago; agachados: Djalma, Ademir, Pirombá, Magri e Walfredo.





Sob a chefia do advogado Hibernon Wanderley, embarcaram o técnico Ricardo Diez, o tesoureiro José Augusto Nogueira, o auxiliar João Freire, o secretário Antonio Menezes – o conhecido Muriçoca, pai do atacante Ademir –, o árbitro José Mariano Carneiro Pessoa, o popular Palmeira, que mais tarde seria técnico de vários times, inclusive do Sport, o massagista Matias e os jogadores Navamuel, Magri, Bibi e Ciscador. Viajaram também Pedrinho, Pinhegas e Castanheira, emprestados pelo América, e Salvador, cedido pelo Náutico. No Rio, incorporar-se-iam à comitiva os atletas que estavam no selecionado estadual, à exceção de Mulatinho e Clóvis, que regressaram à capital pernambucana por motivos pessoais.

iNSUCESSO NA ESTREIA

Na estreia do Sport, no Rio de Janeiro, houve pouco destaque na imprensa carioca. Foi no dia 12 de dezembro de 1941, no campo do América, em Campos Sales, contra o Flamengo. Sem os dois zagueiros, Salvador e Zago, Ricardo Diez obteve junto ao América, a cessão de Aralton e Linton. Vitória do Flamengo por 3 x 1. O árbitro foi o pernambucano Palmeira (José Mariano Carneiro Pessoa), que acompanhava a delegação.

Gols de Rubem (2) e Aralton (contra) para os cariocas, e do argentino Magri para os pernambucanos.

Flamengo: Doutor; Nilton e Barradas; Biguá, Jaime (Volante) e Artigas; Peixe, Valdir, Rubem, Perácio (Nandinho) e Vevé. 

Sport: Manuelzinho; Aralton e Linton; Pitota, Furlan e Bibi; Navamuel, Ademir, Pirombá, Magri e Valfredo.

EM MINAS, CANTANDO DE GALO

Do Rio, a equipe pernambucana seguiu para Belo Horizonte, onde o técnico Ricardo Diez e o zagueiro Zago, que já haviam militado no futebol mineiro, foram bastante badalados. O jogo inicial realizou-se em 18/12/1941, contra o América, que rivalizava diretamente com o Atlético, constituindo-se na segunda força do futebol das Alterosas, pois só décadas depois é que o Cruzeiro, time da colônia italiana, chamado inicialmente de Palestra Itália, viria a explodir.

A presença dos pernambucanos era uma novidade para a torcida mineira, acostumada com equipes do eixo Rio-São Paulo, principalmente, sem jamais ter visto um time do Nordeste. O futebol envolvente do Sport empolgou os torcedores no Estádio Otacílio Negrão de Lima. O juiz mais uma vez foi Palmeira, e a partida terminou com a contagem de 5 x 1 para os visitantes, gols de Pirombá (2), Ademir, Magri e Navamuel. Carlos Alberto marcou para os mineiros.

América: Vavá; Lulu e Pescoço; Cabral, Tiago e Buzachi; Carlos Alberto, Didico (Armandinho), Camilo (Curi), Gerson e Alfredinho.

Sport: Manuelzinho; Salvador e Zago; Pitota, Furlan e Bibi; Navamuel, Ademir, Pirombá, Magri e Pinhegas.

A notável estreia dos pernambucanos mereceu  elogios da crônica esportiva mineira, criando condições para que outro jogo fosse acertado. No dia 21/12/1941, o Sport enfrentou o Palestra Itália, hoje Cruzeiro (o nome foi mudado, assim como o do Palmeiras de São Paulo, que também se chamava Palestra Itália, por causa da posição da Itália, ao lado da Alemanha e do Japão, no confronto com os Países Aliados, na Segunda Guerra Mundial). O Sport não teve a mesma desenvoltura do jogo anterior. No final, um empate de 0 x 0 satisfez a mineiros e pernambucanos.

Depois de enfrentar o América e o Palestra, o Sport voltou a campo no dia de Natal, portanto, em 25/12/1941, para conquistar uma histórica vitória sobre o poderoso Atlético Mineiro, que, num período de 22 anos só havia perdido uma vez no seu estádio, por onde já haviam passado grandes equipes cariocas e paulistas.

Mais uma vez, Palmeira apitava a partida. O Galo Carijó, empurrado por sua inflamada torcida, abriu a contagem, mas o Sport não só conseguiu empatar, como virou o placar. Ao terminar o primeiro tempo, os rubro-negros venciam por 3 x 1.

Na segunda fase, apesar de todo o esforço dos mineiros, o Leão foi quem terminou cantando de galo, ao estabelecer a contagem final de 4 x 2, marcando Ademir (2), Furlan e Magri (Sport); Euclides e Baiano (Atlético). Baiano foi expulso nos instantes finais por ter agredido o goleiro Manuelzinho.

Atlético: Kafunga; Ramos e Canhoto; Cafifa, Hemetério e Bigode (o mesmo da Seleção Brasileira, na Copa do Mundo de 1950); Bené (Edgar), Tião, Baiano, Nicola (Euclides) e Edgar.

Sport: Manuelzinho; Salvador e Zago; Pitota, Furlan e Bibi; Navamuel, Ademir, Pirombá, Magri e Djalma.








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