Neste domingo, 3 de
fevereiro de 2019, o Santa Cruz Futebol Clube, fundado em 3 de fevereiro de
2014, está completando seus 105 anos de fundado. Em homenagem à data, iniciamos
uma série de reportagens sobre um dos episódios mais dramáticos vividos pelo
Clube das Multidões ao longo de sua história. Vejamos:
Drama,
tragédia, lágrimas, aventura e lances de comicidade. Tudo isso marcou a mais
fantástica excursão, de que se tem notícia, de uma equipe pernambucana, quiçá
brasileira. Foi em 1943, portanto, há 73 anos, quando o time do Santa Cruz
deixou o Recife, viajando de navio, para realizar uma temporada no Extremo
Norte a fim de garantir a folha de pagamento por algum tempo.
Seria
uma viagem normal, como a que o próprio Santa Cruz tinha feito duas vezes, em
1935 e 1941/42, com o mesmo destino: Belém. Desta vez, porém, o mundo estava em
guerra. As forças nazistas, comandadas por Hitler, avançavam cada vez mais,
tendo sido formado para combatê-las, o bloco aliado, ao qual o Brasil se
incorporou. Os submarinos alemães percorriam o litoral brasileiro, na sua ânsia
de afundar navios, com a nossa bandeira ou não. Entre 1942 e 1944, 36
embarcações nacionais foram torpedeadas, causando 1.074 mortes. Por essa razão,
a viagem foi considerada um risco muito grande, e a delegação recebeu a
denominação de Embaixada Suicida.
Em pé:Pedrinho, Pelado, Omar, Eutímio, King, Amaro
Caju, Sidinho II e Pinhegas; agachados: Limoeirinho, Guaberinha, França, Papeira
+, Sidinho e Capuco.
Foram
quatro meses fora do Recife, culminando com a morte do goleiro King e do
atacante Papeira, sepultados na capital paraense. Os navios só viajavam em
comboios protegidos por barcos da Marinha de Guerra, o que fez com que o Santa
passasse muito tempo retido em Belém, aguardando o momento de voltar para casa.
A saída do Recife ocorreu no dia 2 de janeiro, e o regresso em 2 de maio.
–
Quando voltamos, Marcelo, meu filho de seis anos, não me reconheceu – disse-me certa vez Gerson Lins de Miranda, o célebre
Guaberinha, um dos mais importantes jogadores do tricolor pernambucano naquela
época.
Sem
transporte para retornar a Pernambuco, a delegação do Santa foi ficando por lá,
passando por dias de dificuldades e incerteza. É ainda Guaberinha que depõe
sobre aquela aventura vivida pelo Mais Querido em plena Amazônia, num tempo em
que chegar lá já era complicado, quanto mais naquela época em que o mundo
inteiro sentia os horrores da guerra:
–
Fome, por exemplo, nunca chegamos a passar, e a maior privação mesmo era querer
voltar sem ter condições. Tinha jogador que chorava, como Limoeirinho, ou Amaro
Caju, um dos mais chorões. Eu mesmo chorei algumas vezes, pensando na família.
Guaberinha,
que se orgulhava de ter jogado nas 11 posições, pois até chegou a quebrar o
galho no gol, quando o goleiro se machucou durante um jogo, para poder viajar
com o Santinha precisou obter uma licença da função de estereotipista que
exercia na oficina da Folha da Manhã,
pertencente ao importante político Agamenon Magalhães, que por duas vezes
esteve à frente do Estado.
Agamenon
era um apaixonado torcedor do Tricolor do Arruda, e no seu jornal, trabalhavam
também o goleiro Eutímio e o chefe da delegação, o jornalista e diretor coral Aristófanes
da Trindade. Era a segunda vez que aquele dirigente desempenhava tal uma vez que havia chefiado a comitiva
tricolor na excursão anterior àquela região. Só que navegando por águas mais
tranquilas. Agora, Tofinha, como era tratado na intimidade, a exemplo de seu
xará Aristófanes de Andrade, tinha uma tríplice responsabilidade, pois além de
presidir a embaixada, funcionaria como treinador e tesoureiro.
ENFRENTANDO
O PERIGO
As principais cidades brasileiras
dormiam às escuras diante da possibilidade de incursões aéreas do poderoso
inimigo. Foi nesse clima que a direção do Santa Cruz contratou com o Tranviário, uma temporada de cinco
jogos, em Belém, por 25 contos ou 25 mil cruzeiros, 5 mil por partida. Por
coincidência, o time coral viajou numa embarcação chamada Pará, pertencente ao
Loide Brasileiro. Saída em plena madrugada. O clube vivia mais uma de suas
habituais crises.
– A equipe profissional decaíra
bastante. Vicente (goleiro), que era
o esteio da defesa, se transferira para o Náutico. Enquanto isso Tará, o melhor centroavante da Região naquela época,
estava de malas arrumadas para seguir o mesmo caminho – disse Aristófanes num
extenso relatório-reportagem apresentado no retorno da delegação. Por sua vez, China
e Siduca haviam informado, antecipadamente, que não poderiam viajar.
Os desfalques levaram o Santa a
contratar para a excursão, Zé Maria, Pinhegas, King e Omar, que estavam
desempregados, saídos do Sport e do América. Na passagem por Fortaleza, o
atacante França incorporou-se à delegação. Emérito contador de piadas, divertia
a turma com seu repertório inacabável, além de ser um bom violonista. Logo recebeu o apelido de Diabo Louro.
Além do chefe Aristófanes, a comitiva
contou com um árbitro oficial, como era praxe, missão que coube a José Mariano
Carneiro Pessoa, o popular Palmeira, da FPD (Federação Pernambucana de
Desportos), mais tarde, técnico. Palmeira tinha acompanhado a equipe do Sport
em fins de 1941 e início de 1942, na célebre excursão do Rubro-Negro ao
Centro-Sul. Desta vez, além de juiz, funcionava, também, como supervisor.
Viajaram 16 jogadores: King e Eutímio (goleiros); Cidinho II, Pedrinho e Zé
Maria (zagueiros); Omar, Pelado, Capuco, Amaro Caju e Guaberinha (médios);
Edésio, Limoeirinho, Cidinho, Pinhegas, Papeira e França (atacantes).
Comentários
Postar um comentário