LENIVALDO ARAGÃO
Deu bode nos Aflitos
Hexacampeão
pernambucano, o Náutico, em 1969, tentava o heptacampeonato, embora estivesse
nas últimas. Dava mostras de que já não tinha fôlego para tanto. Terminaria
sendo desbancado pelo Santa Cruz. Este iniciava a trajetória que o levaria à
conquista do pentacampeonato. Por sua vez, o Sport mudava constantemente de
técnico e de jogadores para, no fim da jornada, novamente ver os “inimigos”
fazerem a festa.
Haveria
mais um Clássico dos Clássicos. Um trio de dirigentes do Sport, que tudo fazia
para infernizar a vida dos alvirrubros, procurou o repórter Amaury Veloso, do Diário de Pernambuco, mais tarde
assessor de imprensa do Leão. Os três queriam que o jornalista os levasse à
presença do pai-de-santo Edu, que se vangloriava de ter dado o Hexa ao Náutico,
com seus banhos de sal, de arruda, alecrim do mato, coisa e tal.
Certo
dia, lá se foi Amaury, que na época cobria o Sport para o DP, ao Palácio de Iemanjá, em Olinda, com José da Silveira Barros,
conhecido por Coca, João Brito e Fernando Samico, todos figuras de proa no
departamento de futebol do clube da Ilha do Retiro. Formavam o trio CBF – Coca,
Brito e Fernando. Havia outra sigla na qual se abrigavam, nada respeitosa. Era
o DeCar – Departamento de Cara... Deixa pra lá.
A
missão do Sport era espinhosa porque o jogo era nos Aflitos. Fazia cinco anos e
três meses que o Timbu não perdia em casa. A última derrota do Timbu em casa tinha
sido em 9 de dezembro de 1963 para o Santa Cruz. Então, era necessário apelar
para os poderes sobrenaturais para derrubá-lo naquele domingo, 30 de março de
1969.
O
DeCar desembolsou algum dinheiro e acertou o “trabalho” com Edu. Mesmo assim, querendo
fortalecer mais a amarração do tradicional adversário, o irrequieto Fernando Samico
fez uma proposta que foi aprovada pelo pai-de-santo, que era botar um bode em
cena.
Destarte,
como gostava de dizer ao microfone, o saudoso companheiro César Brasil, de uma
fazenda pertencente a Coca foi enviado para o Recife um gracioso caprino. Este
ficou aguardando o momento de participar da festa, sob os cuidados de Gaguinho,
o zeloso gerente da concentração rubro-negra, em Caxangá.
No
dia do jogo, debaixo de sete capas, o DeCar levou o quadrúpede para o estádio. Um
pouquinho antes de as equipes entrarem no gramado, Ilo, um ex-centroavante do
Sport, jogou o bicho, envolto num pano com as cores alvirrubras, por cima do
alambrado para dentro do campo. Foi aquele auê.
O
animal ficou espantado e começou a correr em várias direções em meio a uma
grande algazarra. A gritaria deixava-o imensamente perturbado. Uns achavam que
se tratava de mais uma jogada de Edu para proteger o Timbu, posto que em campeonatos
anteriores, o técnico Duque sempre contava com sua proteção.
Acontece,
porém, que o treinador do Náutico agora era outro, o gaúcho Paulinho de
Almeida, que nem sabia quem era Edu. De qualquer forma, a dúvida ficava no ar,
povoando as arquibancadas e gerais do estádio. O bode não parava de correr, atarantado,
principalmente com os fotógrafos e cinegrafistas que o perseguiam. E o povão
gostando, como dizia a célebre propaganda das Casas José Araújo.
Quem
conhecia de perto o DeCar, admitia a possibilidade de a presepada ter sido
engendrada pelo trio. Levava a marca dos três presepeiros. Ou poderia se tratar
de um “serviço” feito por algum concorrente do famoso Edu, justamente para
anular o “trabalho” da velha raposa alvirrubra.
Assim, o Clássico dos Clássicos teria se transformado no Clássico do
Catimbó.
A
verdade é que o bode ficou altamente estressado. Em vão tentaram pegá-lo. O
coitado mostrava-se cada vez mais tomado de pavor com o alarido da multidão, algo
parecido com o Coliseu em dia de morticínio, como a gente vê no cinema.
Até
que em dado momento, na velocidade em que vinha, o animal entrou na barra que
fica no lado da Rua da Angustura, onde está a entrada principal do estádio. Enganchou-se
na rede, pobrezinho. Mais risos da plebe ignara, como afirmava Nelson Rodrigues.
Mais agonia da parte daquele participante involuntário da festa do futebol. Não
foi difícil tirá-lo dali.
O
epílogo dessa história é que a invencibilidade do Náutico em seu campo foi
quebrada. O Sport ganhou o clássico por 1 x 0. O gol foi contra, marcado
naquela mesma barra, onde o bode se embaralhou.
Quem
teve a má sorte de fazer o gol que derrotou o próprio time foi Nilton, um
quarto-zagueiro muito clássico, que havia saído do Sport para defender o
Náutico. Curiosamente, Nilton enfrentava sua ex-equipe pela primeira vez.
Vê
se pode? como indaga o criativo Carlos Pinheiro, na sua “Coluninha Indiscreta”,
todas as semanas, no jornal Vanguarda,
de Caruaru.
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