Nos bons tempos, um América arrasador e bicampeão

Uma das formações do América em 1918. E/D, em pé, Bermudes, Robinson, Ayres, Jorge Tasso e Alexi; agachados, Rômulo e Soares, dupla do meio, Karl, Siza, Zé Tasso e Perez (História do Futebol)



Neste 12 de abril de 2020, o América Futebol Clube completa 106 anos de fundado. Inicialmente localizado na Avenida João de Barros – João de Barros foi seu primeiro nome – o clube alviverde reina na Estrada do Arraial, bairro de Casa Amarela. É verdade que já não tem a grandeza do passado. Porém, ainda resiste às intempéries, graças à resistência movida por um grupo de abnegados, a maioria trazendo no sangue a tradição familiar.  

Nesta reportagem, contamos a história do bicampeonato conquistado pelo Periquito em 1918/19, que o colocou na condição de um dos mais respeitados times pernambucanos durante muitas décadas.

Primeiro bicampeão pernambucano em 1916/17, o Sport foi superado pelo América nos dois anos seguintes.

O Alviverde, com a equipe que era considerada a melhor do campeonato, também foi “bi”. A exemplo do Sport, os americanos trouxeram jogadores de fora para reforçarem seu time. Tal procedimento num futebol essencialmente amador não era visto com bons olhos, embora fosse legal. Assim, em 1918 e 1919, quando mandou no pedaço, o América esteve reforçado do zagueiro Alexi e do center half ou centromédio Bermudes, ambos da Associação Atlética Palmeiras, de São Paulo – nada a ver com a atual Sociedade Esportiva Palmeiras – e do atacante Perez.

ARRASO
O Alviverde começou arrasador, e de saída foi logo aplicando a maior goleada sofrida pelo Náutico, até hoje, nas suas 104 participações no certame. Numa tarde em que tudo dava certo para os americanos, o goleiro alvirrubro, Nelson, foi buscar dez vezes a bola no fundo da rede. Placar final, 10 x 1 para o América. Os gols dos americanos foram assinalados por Zé Tasso (3), Monteath (2), Sigismundo (2), Soares (2) e Karl. Para o Náutico marcou Ivan.

Não ficou nisso. No prosseguimento da sua campanha, o América, cuja torcida crescia paralelamente ao sucesso dentro de campo, metia outro 10 x 1, agora no Torre. Os gols foram de Zé Tasso (6), Perez (3) e Juju, para o América, e Oscar para o Torre.
O Sport também foi vítima da equipe das famílias Tasso, Cabral de Melo, Loyo e mais tarde Moreira. Só que o Rubro-negro perdeu por um placar mais “ameno”: 6 x 1.
            O grande nome da equipe esmeraldina era o atacante Zé Tasso, que havia começado no Santa Cruz e mudara de time por pressão de seus familiares, todos abrigados sob o guarda-chuva alviverde. Era irmão do goleiro Jorge Tasso.

A CONQUISTA
Em 1918, ano do primeiro título americano, em junho, a Liga Sportiva Pernambucana decidiu devolver o campo dos Aflitos ao empresário Frederico Lundgren. O Náutico alugou-o por quatro anos, passando a realizar ali os jogos cujo mando lhe pertenciam.
Foi lá que o América voltou a enfrentar o Alvirrubro, agora pelo segundo turno, tendo obtido outra vitória, agora por 3 x 0.

Na época ainda existiam os campos da Jaqueira, que era utilizado pelo América, o British Club, na área onde se situa o Museu do Estado, pertencente ao América, e o da Avenida Malaquias, no bairro dos Aflitos, nas imediações da AABB – Associação Atlética Banco do Brasil – utilizado pelo Sport.

O campeonato de 1918 contou com a participação de seis equipes e foi dividido em dois turnos, no sistema de pontos corridos. O América realizou 10 jogos e ganhou 17 pontos (cada vitória valia dois pontos), tendo vencido oito partidas, empatado uma e perdido outra. O vice-campeão foi o Santa Cruz.

O título foi consolidado em 12 de janeiro de 1919, portanto, já no ano seguinte, com uma vitória por 3 x 1 sobre o Sport, no campo da Jaqueira. Arbitragem de Mr. J. Foster. Os gols foram marcados por Zé Tasso, Juju e Perez – América; Pedro Marzulo – Sport.

O campeão América alinhou: Jorge Tasso; Ayres e Alexi; Rômulo, Bermudes e Soares; Siza, Perez, Zé Tasso, Juju e Lapa.

A campanha americana teve os seguintes resultados:
            1º Turno
28 de abril                 Náutico 1 x 10 América
13 de maio                Flamengo 1 x 3 América
09 de junho              Santa Cruz 1 x 2 América
23 de junho              Torre 1 x 6 América
21 de julho               América 6 x 1 Sport

2º Turno
18 de agosto            Náutico 3 x 0 América
07 de setembro        América 1 x 1 Flamengo
08 de dezembro       Santa Cruz 2 x 0 América
22 de dezembro       Torre 1 x 10 América
12 de janeiro (1919) Sport 1 x 3 América

O BICAMPEONATO

Campeão em 1918, com o reforço dos paulistas Alexi, Bermudes e Antônio Perez, o América Futebol Clube continuava a receber críticas dos seus concorrentes. Estes combatiam a presença de jogadores de fora em qualquer equipe que estivesse disputando o Campeonato Pernambucano. O regime era de puro amadorismo. A importação de atletas tornava-se uma grande deslealdade, alegavam dirigentes de Santa Cruz, Náutico, do novato Varzeano e do Torre. Com essas importações, o Alviverde colocava-se num nível superior em relação aos demais participantes do campeonato.

O América, porém, não estava nem aí. Além dos três reforços que haviam disputado o campeonato anterior, O Periquito trouxe ainda, para 1919, Felipe Perez, irmão de Antônio Perez, e Salermo. Portanto, meio time de jogadores importados.

Os bicampeões (Campeões de Futebol)


Os protestos eram estendidos ao Sport, que usava do mesmo expediente. América e Sport alegavam que agiam dentro da legalidade, pois o enxerto era permitido. Que os demais clubes fizessem o mesmo.

Na realidade, nada existia no regulamento que combatesse a inclusão de jogadores de outros centros futebolísticos nas equipes recifenses. O que terminou se fazendo para evitar que o reforço fosse contratado em cima da hora de uma decisão, por exemplo, foi estabelecer um prazo. O jogador que viesse de fora, teria que respeitar um período mínimo de 60 dias antes de entrar em ação. Estava estabelecida a “lei do estágio”. Já que não era proibido por que não tirar proveito da situação? Era assim que raciocinavam os dirigentes alviverdes.

Agindo dessa forma, o América por algum tempo dividiu com o Sport a liderança do futebol pernambucano. Eram os colecionadores de títulos, que ganhavam seguidamente, enquanto os outros se esforçavam e não chegavam lá. Fora da dupla, apenas o Flamengo, isso na primeira edição do campeonato. Depois daquela façanha, o Alvinegro não teve mais a glória de beber o champagne na taça reservada ao campeão. Para os concorrentes de alviverdes e rubro-negros, o poder econômico é que fazia a diferença. Por essa razão, todos voltavam-se contra a aquisição de atletas de Estados onde o futebol estava mais adiantado.

LÉPIDO E FAGUEIRO
Indiferente às críticas, o América foi cuidando de dar tratos à bola. Começou a remover os obstáculos que surgiam à sua frente. Como só houve oito concorrentes, e o campeonato teve apenas um turno, o campeão de 1918, agora lutando pelo bicampeonato, caminhou lépido e fagueiro ao longo do certame. Perdeu apenas um jogo, justamente para o Sport que, como ele, trazia jogadores de fora, principalmente para as decisões.

Logo de saída, uma goleada por 5 x 2 no Santa Cruz, o que queria dizer que o campeão pernambucano estava em ótimas condições de batalhar pelo bicampeonato. No decorrer da campanha, as equipes do Varzeano e do Torre também foram vítimas da volúpia de gols de Zé Tasso e seus companheiros, pois também levaram goleadas.

Em se tratando do campeão, cresceu o interesse dos outros times em derrotar o América. Sempre é assim. A equipe que está em evidência é o inimigo a ser abatido. Mas os companheiros do grande artilheiro Zé Tasso iam tirando de letra até a consagração final, quando a conquista do segundo título de campeão e do primeiro bicampeonato foi efusivamente comemorada pela torcida e pelos jogadores americanos.

No dia 23 de novembro, ao realizar sua sétima e última partida na competição, derrotando o Torre por 5 x 0, o América sacramentava a conquista do Bi, no British Club-América Parque, com 12 pontos, levando um de vantagem para o vice-campeão Sport, e coroava sua tranquila caminhada.

FOI PRECISO ESPERAR
O árbitro do jogo em que o América sagrou-se o segundo bicampeão pernambucano, igualando o feito do Sport em 1916/17, foi o Dr. João Lacerda. Antônio Perez, um dos importados, constituiu-se na grande figura do encontro, marcando quatro gols. Zé Tasso completou a goleada.
            América (Bicampeão): Salgado; Alex e Ayres; Rômulo, Bermudes e Soares; Felipe Perez, também chamado de Perez II, Zé Tasso, Antônio Perez e Lapa.
            Torre (Vice-campeão): P. Ramos; Arthur e Romeu; Austragésilo, Roxura e Paulino; Arlindo, Osvaldo, Alemão, Hermógenes e A. Lins.

Jogadores e torcedores do América festejaram a conquista de seu segundo troféu no Campeonato Pernambucano naquele 23 de novembro. Torcedor tem o direito de comemorar quando e como bem entender, porém, o clube teve que esperar algum tempo para ser proclamado bicampeão pernambucano.

Náutico e Varzeano protestaram junto à Liga Sportiva Pernambucana, alegando tratar-se de uma injustiça clubes recifenses, no caso, o próprio América e o Sport, recorrerem a jogadores de outros Estados. Por causa dessa pendenga, a Liga só em 13 de dezembro veio a declarar o América campeão de 1919. Todavia, a torcida americana não tinha mais o que festejar, uma vez que já tinha feito seu carnaval feito.
           
A CAMPANHA NO BICAMPEÃO

04 de maio                Santa Cruz 2 x 5 América
08 de junho              América 2 x 1 Flamengo
06 de julho               América 4 x 0 Peres
24 de agosto            América 0 x 2 Sport
14 de setembro        Náutico 0 x 2 América
12 de outubro          América 6 x 1 Varzeano
23 de novembro      América 5 x 0 Torre


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