Lenivaldo Aragão
Pelé e o repórter, a caminho do saguão dos Guararapes, em entrevista exclusiva (Foto Antonio Barreto) |
Certa madrugada fiz tocaia
no aeroporto porque sabia que Pelé estava voltando do Velho Mundo. Era o ano de
1968. A estação de passageiros tranquila, com um ou outro gato pingado, posto
que o dia ainda estava surgindo. Com os primeiros raios solares, o potente DC 8
estacionou no pátio. Esperei a chegada
dos passageiros e nada de Pelé. Perguntei a alguém se ele estava a bordo e a
resposta foi positiva. Privilégio de rei, uma vez que ninguém ficava no avião.
Eu sabia que era impossível ir
até lá, principalmente em se tratando de um voo internacional. Resolvi dramatizar
a situação. No balcão da companhia aérea, pedi por tudo que me deixassem adentrar
o avião. Era novo ainda, mas tinha responsabilidade de pai de família. Estava
fazendo um teste no jornal e minha contratação muito dependia daquela reportagem.
Conversa mole, pois desde 1958 eu já era do mais antigo da América Latina. O
pessoal de terra passou o assunto para um dos comissários de bordo, que levou
para o comissário chefe e este teve pena do pobre coitado.
– Vou falar com o comandante
pra ver o que se pode fazer – disse-me o simpático aeronauta.
Depois de alguns instantes o
próprio comandante desceu, acompanhado de uma comitiva composta por Pelé, Ciro
Costa, superintendente do Santos, Geraldo José de Almeida, o grande narrador da
televisão naqueles tempos – “que bola, bola” – e mais uma mulher que realizava
um trabalho de marketing para o Santos.
Já tinha feito uma ou outra
entrevista com o melhor jogador do mundo, mas coisa passageira. Ficamos uns 40
minutos conversando, sem ninguém para incomodar, embora as pessoas que iam
chegando mostrassem sua admiração por ver o Rei ali em carne osso. Paguei até
café para ele.
Na ocasião, lhe pedi para fazer
uma comparação entre o Náutico e o Cruzeiro, os dois times fora do Eixo Rio-São
Paulo, que estavam extrapolando. Ele me disse que achava o Timbu melhor do que
o Cruzeiro. A pátria estava salva. O DP publicou uma página com o dono da
camisa 10 mais famosa do mundo.
Feita a chamada para o
reembarque, Pelé agradeceu minha atenção e ainda pediu desculpas por ter
demorado. Foi aí que me fez a revelação:
– Eu preferi permanecer no
avião porque estava batendo um papo com Roberto Carlos.
O grande artista voltava da
Itália após a consagração com a vitória no famoso Festival de San Remo, que sem
dúvida serviu para alavancar sua carreira.
Não havia mais tempo para
nada. E assim deixei de fazer uma reportagem sensacional. Seria o primeiro
jornalista a entrevistar o outro rei, em solo brasileiro, após o seu sucesso no
festival, e ao mesmo tempo juntaria os dois ‘reis’, o do futebol e o da Jovem
Guarda. De qualquer forma minha missão primordial estava cumprida, mesmo que para
isso tivesse que ter dado uma de doido.
Comentários
Postar um comentário