BOLA, TRAVE E CANELA-Lenivaldo Aragão

 ADIOS, MUCHACHA MIA...


Ilustração de Humberto


Em 1973, pelo Campeonato Brasileiro,  o Náutico enfrentou o Moto Club, no Estádio Nhozinho Santos, em São Luís-MA. Empate de 1 x 1, com Jorge Mendonça fazendo o gol do Timbu que, no dia seguinte, logo cedinho, regressou para o Recife. Por falta de lugares nos primeiros voos que se destinavam à capital pernambucana, a turma da imprensa só conseguiu embarcar mais tarde. Entre os radialistas havia um cuja passagem ainda estava em aberto. Era José Bezerra, “o príncipe de São Caetano”, da Rádio Clube de Pernambuco. Ao chegar ao aeroporto, com alguns colegas, o narrador da PRA 8 deparou-se com uma surpresa muito desagradável. O avião em que a turma viajaria estava lotado e ele teria que voltar para casa mais tarde, e sozinho.

Cobra criada, Bezerra sabia que mais cedo ou mais tarde terminaria pintando um lugar, como geralmente acontece. Porém, receava que, estando em terra estranha, sem conhecer ninguém, fosse passado para trás na fila de espera por algum figurão local. O controle não era feito, como hoje, por computador. Funcionário da Sudene, onde exercia a função de assessor de Comunicação, precisava chegar à capital pernambucana o mais cedo possível. Foi aí que entrou em cena, o endiabrado fotógrafo Maurício Coutinho, do Diario de Pernambuco, o qual, dirigindo-se ao balcão da companhia aérea, pediu a uma das atendentes que quebrasse o galho daquele cidadão colocado ao seu lado, que se mostrava bastante aflito. 

Tratava-se do cantor mexicano Pancho Galvez, que tinha um show programado para a noite, no Recife. Sendo assim, o bigodudo – na época, Bezerra curtia um acentuado bigode – não poderia, por hipótese alguma, deixar de viajar, sob pena de causar ao seu empresário um grande prejuízo em dinheiro e em reputação. Sofregamente, o pobre ‘artista’ acompanhava toda a movimentação no balcão, com impaciência e um olhar pidão, que comovia qualquer um. Quando teve que falar alguma coisa com a funcionária da empresa aérea, dirigiu-se a ela monossilabicamente e em espanhol, levando a despachante a acreditar que realmente estava lidando com um estrangeiro. Moreno, baixinho, um pouco barrigudo, vasto bigode, o locutor esportivo lembrava um pouco Bievenido Granda, um cubano que fazia muito sucesso cantando bolero mundo afora.

Solícita, a jovem atendente disse-lhe que tivesse paciência e aguardasse um pouco, pois achava que conseguiria o assento na aeronave.

Lá para as tantas, com a aproximação da hora do embarque, Pancho Galvez já suava frio, acreditando que terminaria sobrando. Foi quando para a felicidade dele e dos colegas, a moça dirigiu-se ao ‘intérprete’ Maurício Coutinho, pedindo a passagem e a carteira de identidade do mexicano. Este tremia ao sentir que ela iria facilmente descobrir a farsa.

– Mas ele é mexicano e nasceu em Pernambuco?

Coitado do cantor, que teve de fazer o maior esforço para não explodir numa gargalhada. Sem perda de tempo, o fotógrafo do DP deu prosseguimento à trapaça:

– É verdade, mas é que ele foi embora para o México, quando tinha cinco anos de idade e, depois de adulto, não quis naturalizar-se, continuando com sua identidade brasileira.

A empregada da companhia de aviação fez que acreditava, abriu um largo sorriso e marcou o bilhete, enquanto Bezerra completava a grea, despedindo-se da maranhense:

– Adios, muchacha mia...   

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