BOLA, TRAVE E CANELA - Lenivaldo Aragão

 ESPERANDO O HOMEM DA MUAMBA


(Foto: Paraguacity)

 

No Campeonato Brasileiro de 1973, o Náutico estava em Belém para enfrentar o Clube do Remo. Vivia-se a explosão da Zona Franca, em Manaus, a uma hora e meia de avião, da capital paraense. Era a grande novidade. Considerava-se um privilégio sem tamanho alguém ir à capital amazonense. Era a oportunidade de adquirir produtos importados jamais sonhados pelas bandas de cá. E com uma vantagem. Os preços os mais convidativos. Quem ia ao Amazonas voltava abarrotado de compras. Nos meios futebolísticos corria uma notícia, tendo como personagens o meia Ademir da Guia e o centroavante Cesar, conhecido entre os jogadores, como Cesar Maluco. Algum tempo atrás, depois de enfrentar o Nacional pelo Brasileiro, a delegação do Palmeiras estava no aeroporto para embarcar de volta a São Paulo. O pessoal da Polícia Federal fazia a fiscalização das bagagens por amostragem. Um dos escolhidos foi Cesar. Tendo passado do limite, o atacante foi notificado para pagar uma multa. Ou então, deixar o excesso de mercadorias lá mesmo no aeroporto. Contrariado, Cesar comentou para um colega de equipe:

–Eu não entendo. Ademir comprou muito mais coisa do que eu e passou, sem problema. Eu que comprei menos, vou pagar multa.

Um fiscal ouviu a conversa, chamou Ademir da Guia de volta, conferiu as mercadorias do meia e estabeleceu uma multa, esta bem maior do que a de Cesar. Ademir, é claro, ficou por conta com o companheiro que, sem querer, o dedurou.

Voltemos à viagem do Náutico a Belém. O que mais os jogadores lamentavam era o fato de estarem ao mesmo tempo tão perto e tão longe do paraíso das compras, sem poderem se deliciar com as inúmeras ofertas das lojas manauaras. Algumas vitrines de Belém mostravam artigos procedentes do Amazonas, mas com os preços lá em cima. E naquele ano, o futebol amazonense estava fora do roteiro do certame nacional, que tinha uma única divisão.

            De um momento para outro estourou uma bomba no hotel. Um comerciante, recém-chegado de Manaus, lotado de mercadorias, telefonara, colocando-se à disposição dos pernambucanos. Tinha muita coisa interessante e prometia preços camaradas, certamente um pouco mais acima dos da Zona Franca, pois estava revendendo e precisava ter lucro. O mercador deixara um recado, marcando um encontro às duas e meia da tarde, na Avenida Presidente Vargas, a principal da cidade. De lá levaria toda a delegação para seu depósito. Foi uma festa. Jogadores contavam o dinheiro que tinham, pensando na possibilidade de voltar a Pernambuco com alguma coisa diferente para casa.

            Na hora aprazada estava a timbuzada lá, inclusive o técnico Mário Celso de Abreu, o popular Marão. E haja espera, haja ansiedade, nada do homem aparecer. Cada transeunte que surgia era uma esperança. Seria ele?  Chegou-se à conclusão de que poderia ter havido alguma bronca com a fiscalização. Talvez o negociante aparecesse no próprio hotel com suas bugigangas,

            Como o tempo estivesse passando, e o Náutico jogaria à noite, Marão determinou que todos se recolhessem, pois precisavam descansar. E lá se foram os frustrados jogadores do Náutico, tristes e de mãos abanando. Vieram saber à noite, depois do jogo que o tal comerciante nunca existira. É que o lateral-direito Borges, que acaba de nos deixar para sempre, aproveitando a ansiedade da turma, tinha resolvido passar um trote. Para não gerar desconfiança, ele mesmo estava lá na avenida, esperando o homem da muamba. Só ele sabia que o muambeiro nunca iria aparecer.. 

Só depois do jogo, Borges contou aos jogadores o que realmente tinha acontecido. A turma levou na gozação, diante do trote muito bem arquitetado. 

E o homem da muamba entrou por uma perna de pinto e saiu por uma perna de pato, como nas antigas histórias infantis.

 

 

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