BOLA, TRAVE E CANELA / Lenivaldo Aragão

 A lei da ‘anestesia’


 


Rubinho foi um vigoroso lateral esquerdo do Santa Cruz, que também jogava de centromédio. Fora do futebol era policial. Quando estava em campo parecia misturar as duas funções, pois batia que dava gosto. Ou desgosto, da parte de quem apanhava. Em 1948, ano em que o Santa Cruz batalhava para tornar-se tricampeão pernambucano pela segunda vez, o que não conseguiu, num Clássico das Emoções, o alvirrubro Zezinho (nada a ver com o célebre Zezinho Caixão) e o tricolor Rubinho disputaram uma bola no alto. Zezinho usou o cotovelo deslealmente e tirou sangue do rosto de Rubinho. O jogador do Santa chegou a cair em campo, desmaiado, todavia, foi medicado e permaneceu na luta. Naquele tempo não havia substituição. No intervalo, o jogador da Cobra Coral recebeu mil advertências de diretores de seu clube para não ir à forra, pois correria o risco de ser expulso.


(Foto: reprodução)

            O turbulento Rubinho jogou o segundo tempo com muita delicadeza, seguindo ao pé da letra os conselhos recebidos no vestiário. Todavia, terminada a partida, com a vitória do Náutico por 3 x 2, não pensou duas vezes. Saiu em perseguição a Zezinho, que partiu, à toda, em direção ao Reservado das Autoridades, onde se encontravam o presidente da Federação, Osvaldo Salsa, que na mocidade tinha sido jogador timbu, e o delegado de polícia da Capital, Eudes Costa. A rota de fuga não funcionou. Ali mesmo, diante dos ‘chefões’, Zezinho recebeu um sopapo de Rubinho, que o levou a beijar a grama dos Aflitos. Osvaldo Salsa considerou um tremendo desrespeito às autoridades e suspendeu Rubinho por 180 dias. Houve uma grande confusão. O Santa Cruz afastou-se do campeonato e foi suspenso pela CBD por 60 dias. Criou-se um tumulto sem tamanho, tendo havido até a intervenção do governador Barbosa Lima Sobrinho, um antigo remador e jogador alvirrubro, no sentido de encontrar o caminho da pacificação.

            Mas, voltemos a Rubinho. Tempos depois, ele entrou noutro imbróglio ao agredir um árbitro. Nesse novo caso não houve contemplação: o castigo foi eliminação sumária do chamado esporte bretão, conforme determinava o Código Brasileiro Disciplinar de Futebol (CBDF). 

O antigo defensor do Mais Querido teve que se contentar em participar das peladas dos fins de semana com os amigos, ou atuar clandestinamente em amistosos de clubes suburbanos. Todavia, como sempre no meio da escuridão há uma luzinha no fim do túnel, lá para frente, Rubinho, embora veterano, animou-se com a decisão de Juscelino Kubistchek, que ao tomar posse na Presidência da República, em 1955, decretou anistia ampla e irrestrita para todos os atletas punidos pela justiça desportiva até aquela data. Nosso personagem exultou de alegria e para melhor certificar-se da situação procurou o advogado Joaquim Correia Lima Filho, presidente do Tribunal de Justiça Desportiva (TJD).

            – Doutor, eu vou ser beneficiado com essa tal de anestesia? – perguntou.

            O homem da lei foi obrigado a engolir o riso, ficou com pena de Rubinho, mas não teve como deixar de lhe informar que ele não estava perdoado, uma vez que a anestesia concedida por JK não beneficiava atletas que haviam sido punidos com eliminação.    

 

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