BOLA, TRAVE E CANELA / Lenivaldo Aragão

  ABUSOU DA MÃO DE VACA E TERMINOU SE EXPULSANDO

 


No Estádio dos Aflitos enfrentavam-se América e Ferroviário pelo Campeonato Pernambucano. Jogo só para cumprir tabela. Nenhum dos dois aspirava ao título de campeão, nem ninguém corria o risco de cair, uma vez que não vigorava a lei de acesso e decesso.
            De saída, o América partiu para cima, criando uma chance atrás da outra, mas gol que é bom, nada. Como, de acordo com a lei do futebol “quem não faz, leva”, o atacante Toia inesperadamente abre o placar para o Ferroviário. O América fica desconcertado. No intervalo, o técnico Dante Bianchi mostra-se muito incisivo com seus jogadores.
– Com esse futebol que vocês estão jogando, vão terminar no Tacaruna.
Com isso, o argentino queria dizer que seu pessoal estava longe de render o que se esperava. O Tacaruna era um time amador, que representava a fábrica de estopas Tacaruna no Campeonato da Segunda Divisão, o popular Campeonato Suburbano.
      Vem o segundo tempo. Quem pensa em reação do América está redondamente enganado. Logo os periquitos começam a discutir. Genival, o capitão, pede para Dandô se desgrudar da bola. O volante retruca, chamando Genival de palhaço. Dilson, o mais tarde médico Dilson Marques, consegue esfriar os ânimos.
            De repente, o jogo vai se transformando em ‘tourada’, com a pancadaria comendo no centro. O árbitro Evandro Ferreira, com seu jeito de pacificador, pede calma, porém, é mesmo que pregar no deserto.
Depois de uma troca de sopapos, Clóvis, do Ferroviário, e Jairo, do América, vão tomar banho mais cedo. Ou seja, são expulsos.
O Campeão do Centenário volta a atacar. Dandô recebe um primoroso lançamento de Dilson, penetra na área e, numa rápida disputa com um zagueiro ferrim, cai, simulando pênalti.
Evandro Ferreira não vai na onda, e Dandô, revoltado, xinga-o acintosamente, cobrando a marcação da penalidade máxima pretendida. É advertido. O dirigente americano Jaime Guerra ameaça invadir o campo para tirar a diferença com Panam – assim Evandro Ferreira é apelidado.
O juiz recebe os primeiros palavrões, oriundos do banco do América e ouve uma vaia sem força da pequena torcida do Alviverde. Dandô consegue seu objetivo, ou seja, complicar a vida do homem do apito.
            Faltando uns 15 minutos para o encerramento da partida, Dandô, que não está jogando essa bola toda, corre para cima do juiz, e com a cara mais lavada do mundo pede-lhe desculpas, ao mesmo tempo em que suplica:
– Seu juiz, me expulse, não quero mais jogar. A ‘lua’ tá muito forte, tô passando mal.
            Evandro, que já tinha vivido situação parecida, com Sarará, um jogador do Sport, diz a Dandô que não pode expulsá-lo porque ele não havia dado motivo. A simples reclamação da cobrança de um pênalti inexistente não justificava uma expulsão.
O volante, por sua vez, não tem como pedir ao treinador para botar outro no seu lugar porque não são permitidas substituições.
Foi só Evandro Ferreira dar as costas a fim de acompanhar o jogo, para Dandô dar aquele pique diretamente para o vestiário.
Ainda no caminho arranja um jeito de dizer aos repórteres, que está sendo sido expulso de campo injustamente, jogando a diminuta, mas assanhada torcida esmeraldina contra o juiz.
            A verdade é que na véspera, no bairro de Santo Amaro, Dandô se rendera diante de uma gostosíssima mão de vaca, regada a uma porção de louras suadas. As consequências, para lembrar o conselheiro Acácio, personagem do grande escritor português Eça de Queiroz, só vieram depois, ou seja, durante o jogo, em forma de um insuportável desarranjo intestinal.
           

 

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