Festa com o Santa, bronca e um juiz atrás do outro em Caruaru
Santa Cruz e Central irmanados antes do jogo (Reprodução Blog Roberto Vieira)
Neco, um antigo garçom, muito considerado em Caruaru, era
aspirante do Central nos idos de 1933 e ficou na reserva do time principal num
amistoso contra o Santa Cruz. Naquele tempo, a presença de uma equipe do Recife
na Capital do Agreste constituía um verdadeiro acontecimento. No caso do Santa,
este era bicampeão pernambucano, lutava pelo tricampeonato e havia levado
jogadores consagrados. Só para citar alguns: Lauro, Esteves, Limoeiro, Walfrido
e Carlos Bening. O Central, por sua vez,
contava com Dedé, Raimundo, Zé Dantas, Tutu e Zé de Nane, como destaques. Tutu
e Zé de Nane formavam uma poderosa ala esquerda, conforme se chamava à dupla
integrada pelo meia armador e pelo ponta-esquerda. Os dois e o próprio Neco
ainda defenderiam o clube patativa, cinco anos mais tarde, na primeira
participação do Central no Campeonato Pernambucano, em 1937.
Certa vez, Neco
me rememorou o tal jogo, contando o fato com riqueza de detalhes. A delegação tricolor
viajou de trem e foi festivamente recebida. Era um verdadeiro empurra-empurra,
com os torcedores querendo ver de perto os craques corais. Os dirigentes do
Santa tinham se deslocado a Caruaru dois dias antes da ida do time para tomar
as providências necessárias. A recepção oficial foi na sede do Sport Club
Caruaruense, com os tradicionais discursos, banda de música e muito “viva o
Santa Cruz!”
O jogo
realizou-se no campo do Colégio de Caruaru, que estava superlotado. O Santa
Cruz começou mostrando categoria, enquanto o Central fazia o maior esforço para
resistir às suas investidas. No apito estava Tom, um conceituado empregado da
Boxwell, empresa beneficiadora de algodão de muita importância, tanto em
Caruaru, como no Agreste pernambucano, em geral. Por volta dos 25 minutos de jogo, houve um
bafafá na área do Central, e os jogadores do Santa Cruz partiram para cima do
juiz, exigindo a marcação de um pênalti. Até o presidente do Santa, o temperamental
Alcides Lima, entrou em campo. O homem do apito perdeu a paciência com tanta
reclamação e caiu fora:
– Sabe de uma
coisa? Tomem essa porcaria e apite quem quiser.
Dito isso, entregou
o apito ao presidente tricolor e se mandou. A confusão aumentou e ninguém se
entendia. O Santa Cruz chegou a ameaçar sair de campo. Foi quando o comendador
e milionário José Victor de Albuquerque, presidente do Central, que tinha a
colaboração do irmão Pedro Victor de Albuquerque, entrou na cancha e fez um
apelo a Aristófanes de Andrade, um dos notáveis da diretoria do time visitante,
para que o Santa Cruz permanecesse em ação, pelo menos, até o fim do primeiro
tempo. Por sugestão de José Victor, o próprio Aristófanes assumiu a arbitragem.
O Santa chegou ao término da primeira fase vencendo por 1x0.
A segunda etapa foi iniciada
com outro árbitro, Harry Leça, cuja família tinha grande tradição no América. Ele
integrava o quadro de árbitros da FPD (Federação Pernambucana de Desportos) e,
por acaso, estava assistindo ao jogo. Com um árbitro de verdade, tudo ia bem
até quando o novo juiz marcou um pênalti contra o Central. Agora foram os
jogadores da terra que acossaram o homem, contestando a marcação da penalidade
máxima.
Bate, não bate,
Harry Leça imitou o primeiro juiz e se mandou. A missão de comandar o resto do
jogo foi confiada a Zezé Fernandes, o lendário lateral tricolor, irmão de
Tiano, craque dos primeiros anos de atividade do Santinha, o mais tarde catedrático
de medicina e senador Martiniano Fernandes.
Mesmo sendo jogador do Santa, Zezé Fernandes não estava em campo
naquela partida. Os times fizeram um acordo, e o pênalti que Harry Leça havia
assinalado, não foi batido. Com isso, o jogo prosseguiu. O Santa Cruz ainda
marcou outro gol. Querem saber como? De pênalti. Desta vez aceito pelo Central.
Assim, o amistoso de quatro juízes e muita confusão chegou ao fim
com a vitória do Santinha por 2x0.
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