Relembrando a aventura do Náutico no Caribe

 

O goleiro Ademar, que deu o nó no grandalhão Chinaglia (Foto: Só Esportes/reprodução)

Num evento literário e esportivo de que participei há algum tempo,  tive o prazer de reencontrar o ex-goleiro Ademar. O paraibano que fez carreira em Pernambuco,  apesar de não ter uma estatura compatível com a posição, foi titular, com muita eficiência na equipe do Náutico. Numa excursão dos alvirrubros ao Caribe, conseguiu segurar um valoroso empate por 0 x 0 com fabulosa esquadra, isso mesmo, uma esquadra, do Cosmos de Nova Iorque. Na época, escrevi a seguinte matéria para a revista Placar (edição 466, de 30/3/1979) da qual eu era correspondente em Pernambuco:

NÁUTICO JOGA POUCO, MAS SE DIVERTE

Uma bagunça geral: aviões que não chegam, adversários que não existem, dinheiro que acaba. Assim foi a excursão do Náutico pelo Caribe. Agora, no Golfo Pérsico, os jogadores curtem a outra face da moeda: muita fartura, mas nenhum divertimento.

Pena que o time do Náutico, quando finalmente começava a desfrutar as delícias do Caribe, tivesse que viajar para o Golfo Pérsico. Uma diferença da água para o vinho, ao pé da letra: em Trinidad Tobago, praia, piscina, mulheres; na Arábia Saudita, deserto, petróleo e, no máximo, um inocente carteado.

Bem verdade que a garotada sofreu e se apavorou, com tantas panes de avião, tantas esperas em aeroportos, tantos jogos cancelados. Mas, a estas alturas da excursão, o pensamento é geral: “Uma grande bagunça, mas foi divertido...”

Os imprevistos, de certa forma, eram esperados. Afinal, os cartolas do Náutico soltaram o time nas mãos do empresário Borg Lantz – que na Suécia, ia arrumando datas, lugares e adversários. Seu compromisso seria acertar um mínimo de oito jogos, com cota de quatro mil dólares. E seja o que Deus quiser.

Lá se foram, pois, os meninos alvirrubros pelo mundo afora. À parte o centroavante Campos (26 anos) e o armador Didi Duarte (28 anos), velhas piranhas de outros carnavais, o elenco era todo imberbe. Washington, Evaristo, Joubert e Dimas saíram direto da seleção juvenil pernambucana. Cid e Pinheirense jamais tinham entrado num avião (e, de cara, enfrentaram um gigantesco Jumbo). E por aí.

Dia 2 de março, eles embarcaram para o Suriname. Só que não chegaram lá: em Manaus, o avião que faria a conexão estava retido no Panamá, e retido ficou. Já se vê, o jogo de estreia foi para o espaço.

Dia 5, ainda em Manaus, o time é informado de que ainda não pode embarcar: um outro avião, arrumado às pressas, está enguiçado. Quando finalmente eles entram no jumbão, rumo a Caiena, todos batem três vezes na madeira. Só para prevenir.

Em Caiena, escala de uma noite, e embarque no dia seguinte para Porto of Spain, Antilhas, onde estava previsto jogo contra a seleção de Trinidad Tobago. Mas, como não havia ninguém à espera, os jogadores ficaram presos na alfândega: as autoridades negavam-se a permitir sua entrada no país, sem o aval de um responsável

Cinco horas depois, a polícia local descobre um despachante que tem o contrato. Só que, outra surpresa: o adversário seria o grande Cosmos, time de Carlos Alberto, Marinho e Beckenbauer.

- A alegria foi geral: se o time se saísse bem, o resultado iria repercutir – conta Hélio Pinto, dublê de empresário e jornalista, incluído na delegação como quebra galhos. Veterano em viagens internacionais, Hélio arranha um pouco de tudo, e sempre ajeita uma situação por mais delicada que seja. E veio o jogo, empate em zero, celebrado com honras de vitória. Ademar, o goleiro, foi herói, com suas defesas, recebendo cumprimentos pessoais do centroavante Giorgio Chinaglia, do Cosmos.

Isso foi dia 7. Então, arrumou-se nova data e lugar (dia 9, San Fernando) para o amistoso contra a seleção de Trinidad. Minutos antes da partida, os jogadores estão uniformizados, aguardando a chegada do ônibus que os conduzirá ao estádio. E vem a contra-ordem: não haverá jogo.

Acontece que, enquanto o Náutico está de camisa e chuteira no hall do hotel, os locutores José Bezerra e Barbosa Filho, da Rádio Clube, chegam ao estádio para instalar seus equipamentos . E não encontraram viv’alma. Muitas horas depois, descobre-se que uma briga de federações causara o cancelamento do jogo.

Com apenas um jogo em muitos dias e muitos aviões de excursão, os jogadores resolveram se enturmar pela área. Fala-se inglês em Trinidad, mas para turistas em férias e atletas em disponibilidade, língua não seria empecilho. “Houve gente que até trocou de apartamento”, confidencia Hélio Pinto. Marinho Chagas, que estava com o Cosmos, juntou-se aos colegas de seu ex-clube, aprontando boas farras. Pelas ruas, Dimas e Jairo Mendonça (irmão de Jorge) se divertiam soltando ferozes palavrões ao ouvido de atônitas mocinhas do lugar. Didi Duarte, embora experiente, quase foi atropelado: em Trinidad, os carros trafegam na mão invertida, como na Inglaterra. Campos, por sua vez, carregou a garotada para os caça-níqueis, mas a empolgação durou pouco: os meninos logo descobriram que é impossível vencer a máquina.

- Pra dizer a verdade – conta o locutor José Bezerra – a maioria não tinha a mínima noção de onde nos encontrávamos. Estavam, mesmo, perdidos no oceano.

Enquanto isso, o ambiente se animava pela perspectiva de um jogo na Martinica. Em seguida, outra boa novidade: jogo em Guadalupe. Mas o encanto durou pouco. A Martinica não confirmou as passagens e obrigou ao cancelamento de Guadalupe, que fica no caminho.

O lateral Carlos Alberto Rocha e Beckenbauer (Arquivo do Blog)


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