Um murro na mesa fez o Santa escapar de virar caldo de cana
Alexandre Carvalho, o autor do grito, já adulto (Arquivo do Blog) |
Trago
o texto à tona, para lembrar aos inúmeros torcedores do Clube das Multidões
espalhados por todo o Brasil, que embora passe por um dos momentos mais cruciais
e vergonhosos de sua história, desclassificada da Série D, a Quarta Divisão do
Campeonato Brasileiro, a Cobra Coral há de encontrar meios para ressurgir das
cinzas, tal qual a mitológica Fênix. Vamos, portanto, à narrativa:
Fundado na segunda década do Século XX
(03-02-1914), por um grupo de adolescentes, quase todos estudantes do Colégio
Americano Batista, que queriam se divertir jogando futebol, um esporte ainda incipiente
por estas bandas, o Santa Cruz, cuja existência pra lá de centenária tem sido
marcada por sucessivas crises financeiras, viveu seu primeiro grande momento de
dificuldades, poucos meses depois de nascido.
Por um triz, o time dos meninos do Pátio
de Santa Cruz, do central bairro da Boa Vista, não foi desfeito. O clube
necessitava de 35 mil réis (algo parecido com 35 reais hoje), só tinha em caixa
6 mil e não havia a mínima possibilidade de obter os 29 mil restantes. Numa
agitada reunião, um dos presentes teve uma ideia estapafúrdia: o clube seria
dissolvido e o dinheiro existente passaria para os bolsos dos sócios-diretores
para gastarem no caldo de cana elétrico, uma novidade que era a grande sensação
no Recife naquela época. A rigor, a turma jovem da sociedade recifense fazia
ponto lá.
Alexandre Carvalho, um dos fundadores,
considerou uma afronta tal proposta. Inesperadamente deu um murro na mesa e
pronunciou uma frase histórica:
– O Santa Cruz nasceu e vai viver
eternamente!
Logo partiu em busca de uma solução, nem
que para isso o Santa tivesse que sair à rua “esmolando para missa pedida”,
como era costume naquele tempo.
Em companhia de Quintino Paes Barreto,
também fundador, Alexandre foi procurar um construtor abastado, amigo de seu
avô. Ao explicar a finalidade da visita obteve um não categórico, e, em
seguida, recebeu um conselho:
– Menino, esse jogo de bola é para
estrangeiro. Para vocês existe cinema na Rua Nova. Diverte muito mais.
Alexandre não conseguiu esconder seu
desapontamento. O ricaço sentiu a angústia do rapaz e quando ele já se despedia,
fez-lhe um ligeiro ar de riso, puxou-o para um canto da sala e indagou:
– Cem mil réis dão pra vocês começarem?
Não precisa dizer que Alexandre e
Quintino ficaram estupefatos. O aperto coral desapareceria com apenas 29 mil
réis, contando com os 6 mil existentes em caixa. Como nunca tinham visto uma
cédula de cem mil réis, arregalaram os olhos quando receberam a nota novinha em
folha. Era a primeira grande doação feita ao Santa. Uma condição apresentada pelo empresário era
que o fato ficasse em sigilo. E ficou.
Só em 1967, quando o Santa Cruz festejava
o 53º aniversário de fundação, o nome do doador histórico foi revelado. Era
Francisco Maciel, o primeiro membro de uma ilustre família que forneceu vários
colaboradores ao clube, entre os quais o patrono do estádio do Arruda, José do
Rego Maciel, um dos presidentes do Santinha e pai do mais tarde vice-presidente
e presidente provisório da República várias vezes, Marco Antônio Maciel.
Espanto geral entre os demais garotos,
quando souberam do sucesso da empreitada. O clube adquiriu o material de jogo e
treino, incluindo bolas, de que necessitava, e ainda ficou com uma boa grana de
reserva. E o cara que queria transformar o Santa em caldo de cana festejou com os
dois vitoriosos emissários e os demais sócios fundadores do hoje chamado Clube
das Multidões.
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