HISTÓRIAS DO MUNDO DA BOLA-Lenivaldo Aragão

 

Coca Cola no Ferroviário-CE em 1967. Em pé, Pedrinho (pernambucano), Gomes, Luiz Paes, Veto, Carlindo, Edmar e Miltão, goleiro reserva; agachados, Marcos do Boi, Ademir, Facó, Coca Cola e Alísio (Reprodução do Álbum do Ferroviário)


O paraibano Abelardo deixou de fazer graça para a Coca-Cola



 

Há muito tempo, o futebol português começou a ser povoado por jogadores brasileiros. Tanto que a seleção que participou da Copa do Mundo, na África do Sul, em 2010, tinha três compatriotas nossos, naturalizados: Deco, Liedson e Pepe. Este, nascido em Maceió, como Kléper Lavernan Lima Ferreira e iniciado no Corinthians Alagoano, esteve também noutras copas e tem contrato com o Porto, onde está desde 2019, até 2024.

Em certa época havia por lá um montão de gente oriunda de Pernambuco e do Nordeste em geral, espalhada pelas diversas divisões do futebol lusitano. Só para citar alguns:  Mirobaldo, Humaitá, Rubem Salim, Nivaldo, hoje empresário de futebol, que brilhou no Benfica e no Vitória de Guimarães. Djalma, o atacante ex- América-PE e ex-Sport, ainda hoje é lembrado por antigos torcedores do Dragão, como o Porto é conhecido. Duda, o inesquecível Dedeu e, mais para trás, Ivson, Edmur, Caiçara, Geo etc., são outros que deixaram boas lembranças na “santa terrinha”.  

O meia paraibano Coca-Cola foi um dos muitos que cruzaram o Oceano Atlântico, depois de brilhar em seu Estado natal e no Ceará, onde de 1965 a 1973 vestiu a camisa do Ferroviário, que acaba de se sagrar campeão invicto da Série D do Brasileirão 2023.

O Panafiel ia jogar contra o Gil Vicente. Este anunciava a estreia de um jogador chegado do Nordeste brasileiro. Tratava-se de Abelardo, cuja ficha técnica era divulgada pelos jornais. Sua idade, 26 anos.

No Panafiel, o adversário do Gil Vicente, atuava o pernambucano Bite, que fora revelado pelo Sport, tendo defendido vários times nordestinos antes de se mandar para a Europa. Bite ficou curioso para saber quem era o compatriota que iria enfrentar. Conhecera um Abelardo que jogara no Santa Cruz, e que se transferiu para o Botafogo e depois foi defender o Atlético Mineiro. Não se tratava da mesma pessoa, concluiu.


Quando os times entraram em campo, Bite lançou seu olhar investigativo e descobriu que o tal Abelardo era um velho conhecido seu, que no Brasil atendia pela alcunha de Coca-Cola.

Já havia jogado várias vezes contra ele. Correu para abraçá-lo.

– Coca-Cola, que satisfação – disse Bite, puxando o paraibano para o abraço.

Bite estranhou a reação do compatriota:

– Não, Coca-Cola não. Me chame de Abelardo!

O ex-jogador do Sport ficou matutando sobre a reação de Coca-Cola, quando tempos depois matou a charada.

Coca-Cola tinha 31 anos e não 26. Tivera os documentos alterados pelo empresário, passando-se por um jovem brasileiro disposto a vencer em Portugal.  Se alguém descobrisse a tramoia, poderia dar com a língua nos dentes e botar tudo a perder. Ele corria o risco até de ser processado por ter adulterado os documentos. E aí sua carreira iria para o beleléu. O paraibano usou um argumento irrefutável para refugar o antigo apelido:

 – E tem uma coisa. Já que vim pra cá, não vou ficar fazendo propaganda para a Coca-Cola de graça.

O apelido fora recebido ainda na infância, em João Pessoa.

– Como eu era pequeno, magro e preto, me chamavam de “Miniatura de Coca-Cola”. Reclamei e o apelido pegou. Quase ninguém sabe meu nome. Até minha mulher me chama de Coca – disse numa entrevista Abelardo Cesário da Silva, falecido em junho de 1999.

Comentários