Foto: Reprodução Diario de Pernambuco |
Confesso minha covardia, preferi o silêncio
Sob
este título, o conhecido jornalista que acaba de nos deixar, deu seu depoimento,
como tricolor apaixonado, para o livro SANTA CRUZ DE CORPO E ALMA. O artigo de
Ivan Maurício está no segundo dos três volumes, na página 92. Vejamos:
“O domingo amanheceu com jeito de que iria chover. Liguei o rádio e comecei a acompanhar
o
noticiário. Bem cedo, já estava pensando em como ultrapassar o momento das 16
horas.
Hora do
jogo que tanto queria saber e, ao mesmo tempo, não tinha coragem de enfrentar.
Fiquei
trabalhando na internet e ouvindo rádio. Ao meio-dia começaram os primeiros
comentários e as notícias das torcidas se deslocando. Uma briga, em Paulista,
entre torcedores do
Santa e
Sport. Carros buzinando na rua. Zoada nos ônibus.
Confirmada
a escalação de Dênis Marques. Nem almocei. Preferi comer frutas. Ouvido ligado
no
rádio. Os comentários diziam que não tinha favorito. Afinal, “clássico é
clássico e vice-
-versa”,
como bem definiu o craque Jardel. As entrevistas com os jogadores chegando ao
estádio.
Confusão
com a torcida, muita briga. Aí deu para aguentar. Quando o locutor anunciou que
o jogo iria começar, desliguei o rádio. Confesso minha covardia. Não tive
coragem de ouvir o jogo pelo rádio. Televisão nem pensar!
Deitei
na cadeira do papai. Meditei. Um silêncio enorme se fez em
toda
Casa Caiada, bairro da classe média de Olinda. O jogo tinha começado.
Preferi
curtir o silêncio, embora sua indefinição me incomodasse.
Tinha
certeza de que quando algo de significativo acontecesse – o gol – o silêncio
seria quebrado por gritos e buzinaços.
Porém,
o silêncio não é boa companhia. De repente, gritos num
edifício
chique vizinho. Tomei coragem e liguei o rádio. Estava certo de que o gol tinha
sido do Sport. Foi nesse momento que percebi que na classe média chique também
tinha torcedor do Santinha. O rádio trazia
a
comemoração com gritos de tri-tri-tricolor. Gol de Caça-Rato!
Desliguei
o rádio. Voltei à companhia do silêncio e da incerteza. Torcia agora para
terminar o primeiro tempo em vantagem no placar. O relógio do celular parecia
preguiçoso. Esperava um gol de empate a qualquer momento, embora não soubesse o
que estava acontecendo em campo.
Finalmente
terminou o primeiro tempo. Liguei o rádio e a TV ao mesmo tempo. Vi o gol de
Caça-Rato. E mergulhei no silêncio novamente.
Na rua
o silêncio ainda era maior. Fiz uma conta no relógio do celular e projetei a
hora que o jogo iria terminar. Algo em torno de 17h59. Jurei a mim mesmo que
não faria nada até o horário delimitado nas minhas contas. Só se a rua gritasse
e urrasse, Mas, o silêncio reinava.
Às
17h59 em ponto liguei o rádio e a TV. Foi o suficiente para ver o segundo gol,
de Sandro Manoel. A coragem voltou. Agora Acompanhava tudo, as imagens, os comentários.
Os minutos
finais.
A festa. A emoção da torcida.
Mais
uma vez, Santo Expedito – das causas urgentes e impossíveis – revelava a magia
do futebol.
Nem
sempre o mais rico e forte vence. Para alegria do povão, meu Santinha era
tricampeão.”
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