OLHA PRO CÉU

 

Foto: Reprodução


 

CLAUDEMIR GOMES



 “Olha pro céu, meu amor Vê como ele está lindo”. Em 1951 o grande Luiz Gonzaga gravou pela RCA Victor – Olha Pro Céu – que ao longo dos anos se tornaria um dos hinos dos festejos juninos no Nordeste. A letra, feita em parceria com José Fernandes, ressalta a beleza de uma das festas mais populares da região, e berço de tantos amores.

No final dos anos 50, Gonzaga fez uma apresentação no Dispensário São José, em Carpina. Embora eu fosse um menino, o Rei do Baião me despertou a atenção. Nunca esqueci a intimação: “Olha pro céu meu amor!”.

E eu olhava para o céu deslumbrado com as figuras formadas no meu imaginário pelos movimentos das nuvens. A descoberta das estrelas; o Cruzeiro do Sul; a Estrela Dalva...Ah! Como me encantava o balé dos vagalumes. Eu me deitava no chão para desfrutar do encantamento dos efeitos visuais causados por aqueles pequenos seres vivos e luminosos.

Em 1973, no topo dos meus 21 anos, Ney Matogrosso dá um grito de alerta com – Rosa de Hiroshima - para acordar uma juventude embevecida pelos Beatles e Rolling Stones. O poema, de autoria de Vinícius de Moraes, feito em 1946 para ressaltar os horrores causados pela bomba atômica que os Estados Unidos lançaram no Japão, nos é apresentado em forma de canção através da irreverência dos Secos & Molhados. A Rosa de Hiroshima, um cogumelo de horror, nos mostrava que no mundo existia outros céus que contrastavam com aquele do hino de amor de Luiz Gonzaga, que parece restrito ao nosso Nordeste. O céu de Paris, que serve de palco para as apresentações da Esquadrilha da Fumaça com seu colorido azul, branco e vermelho, como se estivesse pintando uma tela de Claude Monet. O céu da Capadócia com seus lindos e sedutores balões coloridos. O céu da Disney iluminado com um deslumbrante show pirotécnico...

A terceira idade me chega com a velocidade da era digital. A reboque trouxe o medo de olhar para o céu. Talvez porque não escuto mais o apelo de seu Luiz Gonzaga. A meninada agora corre atrás de um tal de Safadão. A televisão me mostra as mudanças de cenários. As luzes que vemos cortando o céu do Rio de Janeiro, não são dos vagalumes, são balas de fuzis anunciando os confrontos entre a Polícia Militar e as facções criminosas. Os bordados que vemos no céu de Israel, e no céu do Irã, não são oriundos dos movimentos das nuvens. São drones criminosos que ceifam a vida de inocentes que nada têm a ver com a insanidade dos “donos do mundo”. As imagens dos efeitos causados pela bomba atômica lançada em Hiroshima deixaram a humanidade indignada, com medo dos horrores da guerra. Hoje, os bombardeios que chancelam as várias guerras em curso pelo mundo afora, merecem menos destaque que o Mundial de Futebol de Clubes. O mundo parece não temer mais os efeitos da guerra. Os Estados Unidos não têm apenas uma Rosa de Hiroshima, mas um buquê de rosas nucleares. Noite de 21 de junho em Gravatá. O céu nublado não nos permite fazer nenhuma leitura do que está escrito nas estrelas. Nas ruas, uma multidão se acotovela para ver Safadão. Nunca se viu tamanha população flutuante na cidade. Tapas, empurrões e muito trabalho para o SAMU. Viva São João! As bombas? Os Estados Unidos as soltam pra valer do outro lado do planeta.


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