Central paga leva Íbis para Caruaru, mas Loloca estraga tudo

 

 

Loloca, entre Quinha (E) e Vilmar,  comandando o ataque do River piauiense (Rreprodução)





Década de 1960, Campeonato Pernambucano. O Central tinha uma equipe na qual, entre outros, pontificavam o goleiro Dudinha, o zagueiro Zé Carlos, o quarto zagueiro Jucélio e o meia armador Vadinho, um senhor craque, que depois defendeu o Náutico, de onde só saiu por causa da forte concorrência de Ivan Brondi, o Santos de Pelé, São Paulo e Sport.

Em determinado momento, a Patativa tinha boas chances de levantar o turno e ia enfrentar o Íbis, na época ainda ligado á TSAP (Tecelagem de Seda e Algodão de Pernambuco). O jogo estava programado para o Recife, o que se constituiria num autêntico fracasso em termos de renda. Prejuízo para os dois. Vai daí que os dirigentes do Central  fizeram uma proposta para que a partida fosse transferida para Caruaru. O Central pagaria ônibus e hospedagem, incluindo alimentação, claro, e daria mais um dinheiro por fora à equipe da Capital, além da participação normal na renda líquida, que era de 60% para o vencedor e 40% para o perdedor. O Íbis que não tinha nada a perder, topou.

A torcida caruaruense se animou. Se, mesmo jogando no Recife, o Alvinegro já era considerado favorito, imaginem sendo o jogo em casa. Mas estavam enganados, pois dentro de campo a situação foi outra. O Pássaro Preto tinha um centroavante chamado Loloca, que estava endiabrado nesse dia. Balançou a rede quatro vezes, e com isso os ibienses obtiveram uma memorável vitória pela contagem de 4 a 0.Ou seja, golearam o Central em pleno Estádio Pedro Victor de Albuquerque, hoje Luiz José de Lacerda, apelidado de Lacerdão, para  seguir a moda lançada no Brasil com o surgimento do Mineirão.  

E o clube recifense, na época dirigido por Ozir Ramos, pai do atual presidente Ozir Ramos JUNIOR, ainda saiu de Caruaru com uma boa grana no bolso.

Ruim para Ozir é que foi obrigado a se coçar e pagar um bom bicho aos jogadores, o que antes do jogo não estava nas suas cogitações.

LOLOCA FESTEJADO NO PIAUÍ

Loloca foi descoberto pelo futebol do Piauí, onde virou ídolo, depois de defender o Ceará. Sua passagem pelo futebol piauiense está assim contada pelo “Teresina Antiga-teresina antiga.com”:

Pernambucano de Recife, Eraldo Francisco de Paula, mais conhecido como Loloca, foi um dos grandes nomes que passaram pelo futebol teresinense na década de 1960. Ao lado de Tassu (“Canhão do Poty”), Waldeck, Paulo da Banana, Vilmar (“O professor”) e Gereba, formou parte do grande time do River sessentista que inspirou, inclusive, a criação do famoso hino do clube pelo maestro Luiz Santos.

Nascido em 30 de março de 1942, jogava futebol desde criança nas peladas da capital pernambucana. Mas umas de suas primeiras ocupações nada tinha a ver com o esporte. Trabalhou mexendo com algodão (Cotonicultura) na antiga Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro (SANBRA).

Nesse período atuou no juvenil do Sport Club do Recife. Porém, foi o Íbis Sport Club, da cidade de Paulista (Grande Recife), que lhe projetou para fora do estado. É importante lembrar que nessa época o clube ainda não era conhecido pela alcunha de “o pior time do mundo“, menção infame que receberia só décadas mais tarde após ficar sem vencer um único jogo entre 1980 e 1984.

De 1960 a 1961, sempre na função de ponta-direita atacante, se transformou em uma das grandes sensações do Campeonato Pernambucano com atuações notáveis. Uma delas aconteceu em um domingo, dia 13 de agosto de 1961. O Central fez mudar o local da partida pelo estadual, de Recife para Caruaru, crendo que assim a vitória estaria mais do que garantida em casa e, de quebra, o título do turno daquele ano. O Íbis aceitou porque o adversário havia pago transporte e hospedagem para o clube. O resultado em Caruaru foi um verdadeiro fiasco: Loloca marcou os quatro gols na goleada de 4 a 0 do Íbis sobre o Central.

As grandes atuações lhe garantiram uma experiência no Olaria do Rio de Janeiro. Passou apenas duas semanas por lá. “Eu me sentia abandonado pela diretoria”, alega o ex-jogador.

NA TAÇA BRASIL

Retornou ao Íbis e, em 1962, aceitou convite para atuar no Ceará Sporting Club, de Fortaleza. Esteve durante seis meses no Vozão e estreou logo em uma grande competição: na Taça Brasil daquele ano, hoje considerada a 4ª edição do Campeonato Brasileiro.

Nesse torneio a equipe cearense havia eliminado o River, mas Loloca não jogou, pois ainda não havia sido regularizada a sua transferência na antiga Confederaçao Brasileira de Desportos, no Rio. Foi só no dia 23 de setembro, no estádio Presidente Vargas (Fortaleza), no empate sem gols contra o Paysandu de Belém do Pará, que ele estreou pelo time. Mas não ficou durante todo o jogo. Contundiu-se e aos 25 minutos do segundo tempo saiu de campo. Ainda atuou como titular nas duas disputas contra o Sport – na Ilha do Retiro (Recife) e no Presidente Vargas -, em amistosos, e em uma partida do Campeonato Cearense de 1962 (Nota 1).

Em 22 de abril de 1963, Loloca iniciou mais uma vez um contrato com o Íbis ficando por lá até o ano seguinte quando um acontecimento o fez chegar a Teresina onde até hoje permanece – casado, com filhos, netos e residência fixa na rua 13 de maio, Centro/Sul, ao lado do Palácio da Música: Francisco de Sá Meireles, mais conhecido como Sizoca (Nota 2), estava de passagem por Recife e viu o atleta marcar dois gols pelo Íbis. No dia seguinte, o empresário foi conversar com o jogador que aceitou prontamente a transferência para o clube de Teresina.

No River permaneceu de julho de 1964 a dezembro de 1966 e depois de junho de 1967 a janeiro de 1968 (Nota 3). Na primeira passagem pelo galo, participou da Taça Brasil de 1964 (Atualmente a 6ª edição do Campeonato Brasileiro) marcando aos 12 minutos do 2º tempo o terceiro gol riverino na vitória de 4 a 1 contra o Maranhão no Lindolfo Monteiro.

Foi vice-campeão duas vezes do Campeonato Piauiense, em 1964 e 1965, ambas diante do Flamengo. Partidas vibrantes em que os riverinos já comemoravam o título e o viram escapar entre os dedos, principalmente no certame de 1965 em que um simples empate na segunda partida dava a conquista à equipe. Loloca havia marcado o gol de empate aos 22 do 1º tempo, mas o cearense Gringo anotou o da vitória rubro-negra no último minuto do 2º tempo garantindo o título. A partida seguinte foi apenas figurativa com o Flamengo vencendo por 3 a 2. Os dois gols do River foram marcados por Loloca.

Contra o Flamengo foi expulso de campo duas vezes. Na época não havia cartões amarelos e vermelhos (Só vieram na Copa do Mundo do México, em 1970), mas apenas a ordem do árbitro. Em uma das expulsões, deu um chute em Salvador aos 40 do 2º tempo na final do estadual de 1964. Era o princípio da rivalidade no conhecido clássico Rivengo e nesses jogos os ânimos realmente se exaltavam (Nota 4).

Nos dois últimos anos jogando pelo galo tricolor, esteve poucas vezes em campo devido a uma séria contusão que praticamente comprometeu e encerrou prematuramente sua carreira no futebol profissional. “Tinha um goleiro chamado Brito, era River e Flamengo, e quando fui pra cima dele com a bola eu pisei em um buraco, torci o joelho. Rapidamente ficou inchado. Aqui em Teresina só tinha um médico ortopedista chamado Dr. Portella e me disse que era problema nos ligamentos. Aí eu fiz a cirurgia” (Nota 5).

Algum tempo depois, foi parar no Flamengo. Jogou apenas uma partida. Era um amistoso no Lindolfo Monteiro. Curiosamente o adversário era seu ex-clube, o River. No dia 11 de fevereiro de 1968, saiu do banco de reservas e entrou no lugar de Nílton, mas não conseguiu impedir a derrota por 2 a 0.

Disputaria ainda sete partidas pelo Botafogo, em 1968, marcando apenas um gol. Conta que foi tanto para o Flamengo como para o alvinegro teresinense sem condições devido às sequelas deixadas pela séria contusão que sofreu. “Passei uma temporada também no Botafogo. Mas só brincando ali porque eu não podia mais jogar. Depois disso, parei de jogar e minha esposa arranjou para mim um emprego em uma transportadora de Teresina”.

Infelizmente, Loloca nunca conquistou um título. Marcou, porém, a memória de diversos teresinenses que o viram jogar nos gramados do acanhado estádio municipal Lindolfo Monteiro. Seu nome é citado, inclusive, no samba Riverino de coração. A música, composta em 1966 por Benedito Cesar de Assis, é tocada até hoje, tanto nos smartphones de alguns fanáticos torcedores como nos rádios de pilha, carros de som e alto-falantes do Lindolfo e do Albertão a cada nova partida do tricolor.


(1) – Ficou na reserva nos demais jogos do Ceará Sporting Club pelo estadual de 1962.
– O Cearense de 1962 terminou só no dia 14 de abril de 1963 tendo o Ceará conquistado o título. Loloca, ao que tudo indica, não estava mais na equipe nessa data tendo atuado como titular pela competição apenas no empate de 1 a 1 contra o Ferroviário em 21 de outubro de 1962.
– Até o momento só se conseguiu saber de um gol dele pelo time cearense. Foi também em um jogo contra o Ferroviário, mas dessa vez era um amistoso em 2 de dezembro de 1962, que mais uma vez terminou em 1 a 1.

(2) Sizoca era empresário do River e responsável por indicar jogadores e excursões ao clube nas décadas de 1950 e 1960. Posteriormente, atuou na mesma função no futebol paraense com os clubes Remo e Paysandu.

(3) Não se sabe se jogou por algum clube no intervalo que vai de janeiro a junho de 1967. É muito provável que nesse período ainda estivesse se recuperando – pós-operatório – da séria contusão que teve.

(4) Vale lembrar que a rivalidade só começou pra valer mesmo na década de 1960.

(5) A contusão provavelmente aconteceu no conturbado Rivengo de 20 de março de 1966, válido pela Taça Afrânio Nunes.

 

Acervo de Eraldo Francisco de Paula / Acervo digital Teresina Antiga / Foto por: n/d)o

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